ARTIGO DEDOMINGO: UM MUNDO MUITO ESTRANHO...
Não vejo mais TV, a menos
que ela já esteja ligada. Cheguei a essa conclusão após uma sequência de
viagens onde o aparelho permaneceu desligado durante todo tempo em que estive
no quarto. Até outro dia, a TV era um elemento relevante em nosso cotidiano.
Recordo-me quando ganhei minha primeira televisão, em 1986, como prêmio por meu
desempenho escolar no ano anterior, era um privilégio. Hoje, exercem função de
monitor, retransmissora de jogos de futebol, e provedora de alguns programas
jornalísticos, quando muito.
Não atendo há mais de um
ano o telefone fixo em casa. Sua única utilidade é permitir que eu complete
formulários onde seu número ainda é requisitado. Pela bagatela de R$ 20 mensais
mantenho essa peça de museu ativa, sem exercer a plenitude do meu desapego.
Cheguei a contactar a operadora para cancelá-lo, mas esta me ofereceu 60% de
desconto na linha e resolvi estender minha relação. Inexplicável. Nem sempre
foi assim. Telefone era artigo de luxo até os anos 90. Enquanto cursava a
universidade, em Campinas, fiquei 2 anos sem acesso, valendo-me de orelhões e
de um posto da Telesp, sempre abarrotado de gente, para fazer minhas ligações,
até que todos moradores de minha República resolveram alugar uma linha. Aluguel
de telefone, então declarado como patrimônio em IR! Em pouco mais de 20 anos,
experimentou a massificação e o quase completo desuso residencial.
Não assino mais jornais e revistas
impressos, minhas fontes de informação estão todas digitalizadas. Sou um ávido
leitor desde a infância, cheguei a encapar as edições da extinta revista Terra
por vários anos, tal qual uma enciclopedia, ação complatemente exótica para os
dias atuais. Tablets e smartphones acumulam virtualmente o que antes era
disponibilizado em toneladas de papel. Só não consegui me adaptar aos novos
tempos na utilização de livros, que ainda mantenho em ‘matéria’ , marcados e
rabiscados após cada leitura. Qualquer hora me rendo ao ‘kindle’, é a última
fronteira. Mas aí o que seriam das minhas prateleiras, pelas quais tenho tanto
apreço?
Não levo mais dinheiro em
espécie na carteira. Não que algum dia tivesse carregado qualquer valor
relevante, mas hoje a probabilidade de ter algum ($) para bancar um mero
dadinho de amendoim é quase nula. Sonho com o dia em que papel moeda e fios
serão eliminados de nossa vida. Há pouco mais de duas décadas, além de
dinheiro, o sujeito tinha que carregar um talão de cheques.
O próprio celular deixou
de ser telefone, quem diria. Uso muito mais a transmissão de dados do que voz.
Tenho pouca paciência para atender chamadas de números desconhecidos, muito
provavelmente de vendedores de algo que não preciso, parto da premissa de que
se for algo importante, receberei uma mensagem, e aí entro em contato. O que
seria da nossa vida sem o ‘zapizápi’?
‘Zapizápi’ aliás que
transformou nossa rede de relacionamentos para sempre, com os intermináveis
grupos constituídos por rede de afinidade (ou não). Apesar de cansativo em
várias ocasiões e de exigir uma etiqueta antes completamente desconhecida, sem
essa ferramenta não teríamos acesso a gente (muitas vezes querida) que passou
pela nossa vida e estaria esquecida em uma página qualquer de uma agenda de
papel empoeirada. Mais que isso, nos permite ligações de vídeo gratuitas, coisa
de ficção científica no final do século passado. Já não enviamos cartas, até
e-mails se tornaram obsoletos. Por outro lado, a tecla ‘enviar’ digitada por
engano pode nos trazer situações desagradáveis. Mas o saldo é positivo, quem
quiser se esconder em uma caverna, tem esse direito.
Até o automóvel deixou de
ser o objeto de desejo que já foi um dia, substituído pela comodidade do
transporte urbano gerenciado por aplicativos. Eu ainda não o abandonei por
viver em uma cidade com grandes distâncias e ter filhos em idade que requer deslocamentos
contínuos, mas será o caso de reavaliar essa situação no futuro.
Qual foi a última vez que
você comprou um CD para ouvir música ? E olha que eles se popularizaram no
final do século passado. O consumo de música se dá ‘online’, por streaming. Compras
eletrônicas ganham cada vez mais participação no ‘share’ de consumo das
pessoas, não há quem deixe de fazê-las. Até sapatos eu já adquiri pela ‘web’.
Imaginem o impacto que isso tem na logística e distribuição das empresas.
Quando vejo meus filhos, nascidos
sob essa era, para os quais nossos hábitos antigos descritos aqui são tipicos
de um mundo jurássico que não existe mais, chego à óbvia conclusão que em 20
anos mudamos muito mais que nos 50 anteriores.
Na série espanhola ‘O
Ministério do Tempo’, um grupo de três agentes recrutados em séculos distintos,
um do final do século XVI, outra de meados do século XIX e outro de 1981,
convivem juntos em 2016. O mais interessante nos criativos diálogos entre eles
é perceber que algumas mudanças ocorridas em 35 anos foram igualmente
surpreendentes e impactantes para o sujeito nascido em meados do século passado
vis a vis seus colegas de tempos longínquos. Nesse contexto, prever o que virá nos
próximos 30 anos não deixa de ser inquietante.
Um outro mundo nos espera…
Fonte: “Um
mundo muito estranho” apareceu primeiro em Blog do Victor
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