ARTIGO DEDOMINGO: CLÓVIS ROSSI (*1943 +2019)


(*) por Lúcio Flávio Pinto

Depois de circular por todo mundo ao longo de quase meio século (talvez tenha sido o mais cosmopolita dos jornalistas brasileiros), Clóvis Rossi morreu na sua casa, anteontem, em São Paulo. Recuperava-se de um enfarte, sofrido na semana passada. Foi jornalista durante 56 dos seus 76 anos de idade, 29 dos quais na Folha de S. Paulo. Talvez outro recorde de fidelidade numa época de efemeridade e incerteza.
Por causa da crise do jornal impresso em papel, as viagens de Rossi como enviado especial foram rareando. Essas missões são onerosas ou mesmo caras. A receita da imprensa não sustenta mais o que era o ápice para um repórter: ver a história acontecer com seus olhos. Cruzei algumas vezes com Rossi, no exterior (a última delas em Washington, onde interrompemos nossos roteiros para tomar um café e conversarmos)) e no Brasil (pela última vez, em mais um debate do qual participamos).
Circular por onde aconteciam os fatos mais importantes da conjuntura era o quem mais lhe dava prazer. Mas os momentos inesquecíveis (para mim) eram o fechamento da edição na redação de O Estado de S. Paulo. Cansados e satisfeitos por preparar o jornal para ir às ruas, conversávamos sobre os acontecimentos, trocávamos nossas experiências e enfrentávamos nossas divergências, sob a batuta do chefe e mestre Raul Martins Bastos. Um momento que parece ter desaparecido das redações gélidas de hoje.
Rossi não poderia ser mais paulistano, a começar pelo próprio nascimento, no bairro do Bexiga. Apesar de saber muito, parecia sempre ingênuo e puro, como um meninão, educado e solícito. Seus velhos amigos torciam para que ele continuasse a nos representar nas missões internacionais para nos trazer as novidades com cor e som, nas suas matérias e nos seus relatos pessoais. Clóvis Rossi se foi ainda em plena atividade, entristecendo superlativamente nós todos, que pudemos conviver com ele – e já nos sentimos peças de museu, se não uma cruz no campo – nada santo – da desmemória nacional.

(*) Lúcio Flávio Pinto é jornalista profissional desde 1966. Percorreu as redações de algumas das principais publicações da imprensa brasileira. Durante 18 anos foi repórter em O Estado de S. Paulo. Em 1988 deixou a grande imprensa. Dedicou-se ao Jornal Pessoal, newsletter quinzenal que escreve sozinho desde 1987, baseada em Belém.





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