SOLIDÃO AMAZÔNIDA
Sinceramente,
há muito tempo que não via tanta água desabando no inverno amazônico. Remete
àqueles relatos fantásticos de Gabriel Garcia Márquez em Cem Anos de Solidão.
Uma chuva incessante, parece que o mundo vai acabar e ela não acaba. Lembro da
minha infância em Santarém, antes de construírem o cais e a Av. Tapajós na
orla. O rio subia e alagava tudo, podíamos ficar dias e semanas e meses
inteiros sem sair de casa porque o aguaceiro era interminável. Para quem não
conhece a Amazônia parece algo inacreditável que aqui os rios sobem durante
seis meses e demoram mais seis meses para baixar.
Passadas
décadas, os rios continuam transbordando, as várzeas submersas, gente e gado na
maromba, e na capital as pessoas que podem fazer algo olham a chuva atrás das
janelas e carros e assim fecham os olhos para a desigualdade, a fome, a corrupção,
a exploração econômica, a violência urbana e demais situações extremas que
deveriam deixar a sociedade indignada, mas todos tocam a vida como se fora tudo
um acontecimento cotidiano, banal, um talento que permite levar a vida adiante
nos mais inesperados e atrozes cenários. Como diria o grande carpinteiro da
escrita, poetas e mendigos, músicos e profetas, guerreiros e canalhas, todas as
criaturas desta indomável realidade, temos pedido muito pouco da imaginação.
Porque nosso problema crucial tem sido a falta de meios concretos para tornar
nossas vidas mais reais. Este, o cerne da nossa solidão.
Fonte/Foto: Franssinete Florenzano, em
uruatapera.blogspot.com.br/Tamara Saré, na várzea do rio Amazonas
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