AVANÇA DESTRUIÇÃO DO RIO XINGU
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Conaada Bye Bye Xingu promovida pelo ISA percorreu Volta Grande do Xingu em 2016 | Lilo Clareto |
A
empresa canadense Belo Sun anunciou, anteontem (2/2), a concessão da licença de
instalação do projeto Volta Grande de Mineração, vizinho à hidrelétrica de Belo
Monte, em Senador José Porfírio (PA), antes do governo paraense formalizar a
medida. A mineradora publicou um release em inglês com a notícia antes do fim da
reunião da equipe da Secretaria de Meio Ambiente estadual (Semas) que
discutiria a autorização. O governo do Pará é chefiado por Simão Jatene (PSDB).
Por
volta das 17h, a reportagem do ISA teve acesso ao release da empresa. Pouco
depois, a assessoria de imprensa da Semas negou a informação. A licença só foi
confirmada no site da secretaria à noite, horas mais tarde.
“O
fato da empresa ter anunciado que tinha conquistado a licença antes mesmo de
sua formalização e publicação pelo órgão ambiental responsável demonstra como
foi tratado o licenciamento do empreendimento, com total desrespeito pelos
procedimentos, sem transparência, e com displicência e descaso com a vida das
pessoas que vivem na Volta Grande do Xingu”, critica Adriana Ramos,
coordenadora da Política e Direito do ISA.
Previsto
como a maior mina de ouro a céu aberto do Brasil, o empreendimento é uma
bomba-relógio ambiental, com potencial de causar uma tragédia das dimensões do
rompimento da barragem em Mariana (MG), no final de 2015. A área prevista para
a mina já é seriamente impactada pela hidrelétrica: a redução de mais de 80% da
vazão da água em 100 quilômetros do Rio Xingu causou mortandade de peixes,
piora da qualidade da água e alterações drásticas no modo de vida de populações
indígenas e ribeirinhas.
Conforme
o estudo de impacto ambiental entregue à Semas, o projeto minerário prevê
deixar montanhas gigantes de rejeito com aproximadamente duas vezes o volume do
Pão de Açúcar e a construção de um reservatório também de rejeitos, ainda mais
tóxicos do que os liberados no desastre de Minas Gerais. A mina tem o estudo de
viabilidade ambiental assinado pelo mesmo engenheiro indiciado por homicídio
pelo rompimento da barragem de Mariana. Saiba mais.
A
licença atropela parecer da Fundação Nacional do Índio (Funai) que exige a
revisão dos estudos sobre o componente indígena, pois entende que a versão
apresentada pela Belo Sun é insuficiente para avaliar os impactos do
empreendimento sobre os povos que ali vivem.
“Contrariando
a manifestação das instituições públicas responsáveis pelas populações
indígenas, novamente esses povos que são vulneráveis são deixados em uma
situação de fragilidade sobre os impactos de uma obra como essa, a exemplo do
que aconteceu com Belo Monte”, aponta André Villas-Bôas, secretário executivo
do ISA.
A
Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Pará ingressaram
com duas ações para impedir a licença. O Ministério Público Federal (MPF)
enviou à Secretaria de Meio Ambiente do Pará uma recomendação contra a medida.
Já havia duas outras ações anteriores movidas pelo MPF contra o empreendimento.
Consulta aos povos indígenas
Ben
Hur Daniel da Cunha, defensor público federal, explica que a licença pode ser
suspensa até que sejam feitos os estudos do componente indígena. “Não foi
obedecido o procedimento que exige que sejam feitos os estudos prévios de
impacto ambiental, no caso o impacto sobre a população indígena. Essa decisão
impede que essas comunidades exerçam um direito básico, que é participar das
decisões sobre suas vidas”, alerta. O pedido da DPU deve ser analisado até a
próxima quarta (8/2) e requer a manifestação do governo paraense e da Belo Sun.
As
comunidades indígenas diretamente afetadas não foram consultadas sobre o
projeto, como determina a Convenção 169 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil. Apesar disso, o comunicado da empresa
publicado nesta quinta diz expressar “gratidão aos governos estadual e
municipal, bem como às comunidades locais pelo seu apoio a esse projeto”.
Em
abril de 2016, a Semas chegou a marcar uma cerimônia para anunciar a licença,
mas voltou atrás depois da repercussão negativa. Alguns meses depois, um
relatório da ONU sobre Povos Indígenas no Brasil denunciou a situação. “Uma
licença foi emitida pelo governo do Pará para o projeto de mineração Belo Sun,
que está bem próximo da hidrelétrica de Belo Monte e que afeta diretamente a
comunidade dos Juruna. Isso aconteceu na ausência de consulta para obter o
consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas envolvidos e sem a
condução do necessário e urgente estudo dos impactos ambientais, sociais e de
direitos humanos acumulados. Os potenciais são assim um assunto de grave
preocupação”, escreveu a relatora Victoria Tauli-Corpuz (leia mais).
Uma
das condições para a concessão da licença ambiental de Belo Monte foi o
monitoramento do trecho de vazão reduzida do Rio Xingu por seis anos, já que os
estudos indicaram que não havia certeza sobre os impactos socioambientais da
obra na área. Um novo megaempreendimento não poderia, portanto, ser implantado
na região antes desse período.
Em
maio do ano passado, o secretário de Meio Ambiente do Pará, Luís Fernandes
Rocha, prometeu realizar os estudos sobre os impactos socioambientais
acumulados e sinérgicos dos dois megaempreendimentos antes de tomar qualquer
decisão quanto à licença. Procuradores, defensores públicos, ambientalistas e
organizações indígenas e de ribeirinhos exigem que, além da avaliação desses
impactos, um plano socioambiental que garanta as condições de vida das
populações locais seja apresentado pela administração estadual.
O projeto “Volta Grande”
A
mineradora tem a pretensão de se instalar a 9,5 km de distância da Terra
Indígena (TI) Paquiçamba, a 13,7 km da TI Arara da Volta Grande do Xingu e
também próxima à TI Ituna/Itatá, habitada por indígenas isolados (saiba mais).
A
mina encontra-se próxima da Vila da Ressaca, comunidade de 300 famílias que
depende da roça, pesca e do garimpo artesanal para sobreviver. Se o projeto
“Volta Grande” sair do papel, elas terão que ser reassentadas.
Em
12 anos, a estimativa é que serão extraídas 600 toneladas de ouro. Ao final da
exploração, as duas pilhas gigantes de rejeito de material estéril quimicamente
ativo terão, somadas, área de 346 hectares e 504 milhões de toneladas de
rochas, sem previsão para sua remoção.
Fonte/Fotos: socioambiental.org


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