REALIDADE URBANA: AGÊNCIAS BANCÁRIAS SERVEM DE ABRIGO NOTURNO PARA MORADORES DE RUA EM MANAUS
Espaços internos e as calçadas
das instituições bancárias da cidade são moradia para dezenas de
"habitantes da noite"; histórias permeadas por dramas, perdas e
violência marcam a vida dessas pessoas na capital
O vai-e-vem
das agências bancárias da cidade dá lugar, à noite, ao sono gelado de vários
moradores de rua que escolheram esses locais para “pernoitar” e evitar o máximo
possível o frio e o relento. Esse tipo de “moradia” não escolhe cor, sexo e
credo, observou a reportagem de A CRÍTICA, que acompanhou algumas dessas
pessoas que utilizam tanto a área externa quanto a interna (caixas eletrônicos)
desses estabelecimentos bancários.
O lavador de
carros e catador de latinhas Ercílio Fernandes Guimarães, 35, há 10 anos é
morador de rua e há 5 deles “deita em berço esplêndido” de 22h às 5h30 no
interior da agência do banco Itaú da avenida Sete de Setembro, Centro.
Assumindo ter sido o vício pela bebida, especialmente a cachaça, a causadora
por lhe fazer sair de casa (morava no bairro Braga Mendes), ele diz que prefere
a segurança das instituições bancárias a ter que dormir em outro banco: o das
praças. “Por exemplo: Deus me livre de ter que dormir nos bancos dessas praças
em Manaus. É muito perigoso até para nós que estamos acostumados com as ruas”,
disse ele, pai de uma criança de 9 anos.
Vítima das ruas
Nascido em
Boa Vista, Geraldo Gomes de Souza, de 57 anos de idade, desde os 9 perambula
pelas ruas de Manaus. Ele “escolheu” há alguns anos a entrada da agência Praça
15 de Novembro do Banco do Brasil, na Praça da Matriz, para pernoitar. “Durmo
aqui e em todo canto. Peço dinheiro dos outros”, conta ele, de poucas palavras.
Geraldo é
uma das vítimas dos crimes noturnos da cidade: aposentado por invalidez, ele
sofreu há alguns anos uma fratura na bacia e na perna direita, que dificultam
sua locomoção e o obrigam a se mover com um andador metálico. E, pra piorar, há
dois meses ele teve roubado seu cartão de benefício social do INSS e, por conta
de não possuir nenhum documento, não consegue bloqueá-lo.
“Ele está em
uma situação complicada pois tem problemas de saúde e ainda foi lesado. Já
tentamos ajudá-lo, mas seus documentos foram furtados. O seo Geraldo precisa de
ajuda”, alerta Selma Frade, que diariamente acompanha a via crucis do morador
de rua: é recepcionista da agência onde ele dorme.
Facilidade
A entrada
dos moradores de rua, especificamente na área de caixas eletrônicos, é
facilitada porquê nem todos os bancos costumam bloquear esse setor em especial.
Por determinação do Banco Central, esses guichês deveriam funcionam de 6h às
22h, sendo que, em agências como o Banco do Brasil, por exemplo, é de 6h30 às
18h30.
“Após esse
horário nós fechamos as portas, impedindo que eles durmam no interior. Mas
mesmo assim os mendigos se alojam na porta de entrada, fazendo suas necessidades e sujando o local”, disse o
administrativo predial da agência 15 de Novembro (Praça da Matriz) do Banco do
Brasil, Caio Lopes.
Aspecto que divide opiniões entre
população
O fato dos
moradores de rua dormirem no espaço das
agências bancárias divide opiniões. Contra, por exemplo, está o comerciante
David Batalha, 33, que tem uma banca de café regional próximo ao banco
Santander da avenida Ayrão com rua Comendador Clementino, onde geralmente uma
família de rua se “hospeda” à noite. “Eles abordam os clientes e pedem
dinheiro. Mas a gente não permite que eles mexam com ninguém”, destaca ele.
O casal
Camila Amorim, 57, e Moisés Farias da Silva, 71, utiliza o Itaú da avenida Sete
de Setembro e também critica a permanência deles na área. “Acho isso muito
errado. Sou totalmente contra. É perigoso. O certo seria que as agências
trancassem as suas portas evitando que eles
entrassem pra dormir”, aconselha o aposentado que, junto com a sua
esposa, mora no Rio Pioriní, Zona Leste.
A favor dos
moradores de rua está o jornaleiro Olivar Timóteo Almeida, 58, que há 35 anos
trabalha em uma banca de revistas em frente ao Itaú entre a avenida Sete de
Setembro e Floriano Peixoto. Ele ressalta a solidariedade e prestividade dessa
parcela excluída da sociedade: “Os moradores de rua são pessoas bacanas. Eles
até fazem serviços pra gente, como ir na
loteria fazer pagamentos” .
No entanto,
até o próprio Olivar Almeida tece críticas aos pedintes. “Eles não pertumbam a
gente, nem roubam e tampouco matam ninguém, mas ficam bebendo e mijando nesses
locais, deixando um odor desagradável”, pontua o jornaleiro.
EM NÚMEROS
Há 1.331
moradores de rua cadastrados em Manaus no banco de dados da Secretaria
Municipal da Mulher, Assistência Social e Direitos Humanos (Semmasdh). Desse
universo, cerca de 140 é acompanhado pelo Centro de Referência Especiaizado
para a População em Situação de Rua (Centropop) do órgão. A informação é da
coordenadora do Centropop, Bárbara Silva. E 340 já saíram da condição de
moradoers de rua.
"Esses
moradores de rua que dormem nas agências também são acompanhados. Eles ficam
nessa situação devido a maioria passar o dia nas ruas trabalhando, e como moram
longe, utilizam a rua como espaço de trabalho. A maioria em torno do Mercado
Adolpho Lisboa como estivadores e trabalhadores. E para não voltar para a casa
eles acabam dormindo nas ruas", explica Bárbara Silva.
Fonte/Foto: acrítica.uol.com.br/Aguilar Abecassis
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