MINISTÉRIO REAGE CONTRA 'SEQUESTRO' DE CARTÕES DO BOLSA FAMÍLIA NO AM
O Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) vai pedir à Polícia Federal que
investigue a máfia de comerciantes e lotéricas que retêm cartões de
beneficiários do Bolsa Família na região do Alto Solimões (AM).
Ao mesmo tempo, a pasta
comandada por Tereza Campello apresentará medidas para aperfeiçoar o principal
programa social do governo, especialmente no atendimento a comunidades
indígenas e ribeirinhas. Uma das iniciativas avaliadas é o aumento do prazo de
recebimento do benefício, que passará de 90 dias para seis meses. A medida tem
por objetivo reduzir os gastos de viagens das aldeias e comunidades distantes
até as cidades, onde ocorrem os pagamentos e atuam os esquemas ilegais.
No caderno especial
publicado ontem, Favela Amazônia, o Estado mostrou como atua uma máfia do Bolsa
Família no município de Atalaia do Norte, na tríplice fronteira do Brasil com a
Colômbia e o Peru, onde famílias indígenas do Vale do Javari estão sendo
controladas por comerciantes da cidade. Renikson Monteiro, um dos comerciante
procurados pela reportagem, posou para fotos com o cartão na mão. O
levantamento durou 15 meses e usou dados de 62 municípios.
Em meio a dívidas que só
aumentam, os índios deixam seus cartões do programa e também da Previdência no
comércio local. Há denúncias de que os comerciantes extrapolam nos preços dos
produtos para impedir a retomada dos documentos. Na maioria das vezes, o
benefício não paga nem o combustível usado no barco durante o deslocamento das
aldeias ao centro urbano. A viagem de ida de uma aldeia no Javari até a cidade
costuma durar mais de uma semana. Em troca de galões de gasolina, os
comerciantes ficam com cartões e senhas dos beneficiários.
Segundo o ministério, o
esquema será tema de reunião com representantes da Fundação Nacional do Índio
(Funai) e da prefeitura de Atalaia do Norte. O município tem um Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,450. Trata-se do terceiro pior do Brasil, uma
taxa que está abaixo das médias dos países africanos Benin e Togo, além do centro-americano
Haiti, todos entre os 25 piores do mundo. O IDH é uma escala estabelecida pelas
Nações Unidas que mede a qualidade e a perspectiva de vida.
Antes da publicação da
denúncia, a reportagem apresentou à ministra Tereza Campello três vídeos com
denúncias de comerciantes que retêm o cartão do Bolsa Família. Logo após
assisti-los, a ministra observou que não há solução fácil para o problema. O
aumento do prazo do saque, por exemplo, é visto com cuidado pela ministra. O
temor é abrir brechas que tirem do Bolsa Família a característica de um
benefício regular de alimentação. Também há o risco de índios e ribeirinhos
usarem o dinheiro acumulado em muitos meses na compra de produtos que não
atendem às recomendações do programa social.
Outra medida que deverá
ser tomada pelo ministério é convocar as associações de casas lotéricas. A
ministra exigirá maior comprometimento dos empresários que têm contratos com a
Caixa Econômica Federal para impedir saques de terceiros. É comum comerciantes
receberem os pagamentos das famílias beneficiárias do programa com a conivência
dos donos de lotéricas.
Na avaliação do
ministério, o maior desafio para aperfeiçoar o repasse em regiões remotas
envolve justamente o agente de distribuição dos benefícios. Como não tem um
órgão próprio de pagamento, a pasta depende das lotéricas. Outro desafio é a
barreira imposta por prefeitos de municípios que abrigam territórios indígenas.
Muitos se recusam a fazer o cadastramento de famílias das aldeias.
Saúde nas aldeias
O caderno Favela Amazônia
mostrou, ainda, como crianças e adultos da etnia ticuna, a maior do Brasil,
também no extremo oeste amazonense, sobrevivem num lixão de Tabatinga. A falta
de emprego e de renda afeta famílias indígenas de todo o Alto Solimões, que
concentra um dos maiores números de etnias do Brasil. O crescimento das
cidades, sem planejamento, não trouxe ocupação para seus moradores. Os índios
que migram das aldeias para as sedes dos municípios não conseguem vaga no
restrito mercado de trabalho. O drama da pobreza extrema atinge 40% das
famílias indígenas em todo o País, segundo dados do governo.
Outro problema relatado no
especial foi o elevado índice de criminalidade e de violações de direitos
humanos nas grandes e médias cidades da Amazônia. Um levantamento feito pela
reportagem indicou que 37,4% da população dos 62 municípios mais populosos da Região
Norte estão em áreas de tráfico de drogas.
Lideranças e
representantes da área indígena cobram do governo mais investimento na Funai e
uma reavaliação do papel do Ministério da Saúde nas aldeias. Só neste ano, 16
crianças índias de até 2 anos morreram de diarreia e desnutrição no Vale do
Javari. Técnicos apresentaram relatórios que mostram o mau uso do dinheiro
repassado. Os relatórios feitos pelo Distrito Sanitário Especial Indígena no
Javari, da Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, não
apresentam registros de óbitos com detalhes. Profissionais afirmam que as
diretrizes de execução dos recursos da saúde levam em conta interesses
políticos.
Fonte: As
informações são do jornal "O Estado de S. Paulo"


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