PARÁ: MAUS-TRATOS A ANIMAIS SÃO 70% DAS QUEIXAS AO DEMA


Delegada Juliana Cavalcante

Projeto de lei que está tramitando no Senado endurece as penas a crimes contra os bichos
O Brasil é o 2º país do mundo em população de cães e gatos - número estumado 101 milhões em 2013, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Paripassu com o crescimento do número de animais segue o de denúncias e casos de maus tratos e abandono. No Pará, o abuso contra animais de estimação responde por 70% das denúncias à Divisão Especializada de Meio Ambiente (Dema) da Polícia Civil. Aguarda tramitação no Senado projeto que endurece as penas ao maltrato de animais, crime considerado de menor potencial ofensivo.
A Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet) estima que a população canina e felina brasileira cresce 5% ao ano. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) do IBGE, há no Brasil mais de 52 milhões de cães, enquanto o número de crianças de até 14 anos é de pouco mais de 44 milhões. Casos de abusos contra animais domésticos ainda são encarados de forma natural por boa parte da sociedade.
Em mais uma noite chuvosa de Belém, o engenheiro civil Sérgio Barichello, 29 anos, assistia tevê na sala de casa quando ouviu um pedido de socorro. “Ela invadiu minha casa, literalmente. Acho que ela queria muito viver e sabia que precisava da ajuda. O útero estava exposto, já com larvas, e ela também tinha marcas de queimaduras”, relembra o encontro com Clementine, gatinha sem raça ou idade definida, objeto de campanhas nas redes sociais para arrecadar fundos à sua recuperação.
“No momento que percebi a gravidade dos ferimentos, achei que não teria jeito. Contatei uma vizinha, de uma ONG que ajuda animais abandonados. Levamos a Clementine a uma clínica veterinária e ela conseguiu se salvar”, resume Sérgio. “Nunca nem passou pela minha cabeça tocar a gata para fora de casa. Era um ser vivo ali, diante de mim. Já tive animais de estimação, não conseguiria apenas olhar para o outro lado”, completa Sérgio, que abrigou Clementine, hoje recuperada, na condição de Lar Temporário (LT) para a ONG Amor de Patas, enquanto aguarda interessados em adotá-la de forma permanente.
Clementine pode ter sido alvo de um banho de água fervente - talvez provocado pelos miados em sua luta pela vida. O Projeto de Lei nº 2.833/2011 determina que “o indivíduo que deixar de prestar assistência ou socorro a tais bichos, em vias e ruas públicas ou propriedades privadas, em grave e iminente perigo, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública, sofrerá sanção de detenção, de 2 a 4 anos”.
Penas
Atualmente, a pena prevista na lei 9.605/98 - de Crimes Ambientais - é multa e detenção de três meses a um ano, normalmente convertida em doação de cestas básicas. O PL determina pena de 5 a 8 anos de reclusão a quem matar cães ou gatos, com agravante caso haja crueldade, elevando a punição para 6 a 10 anos de prisão. No caso de abandono de animais de estimação, a pena será de detenção de 3 a 5 anos. Uso de corrente, corda ou aparato similar para manter os animais presos em propriedade particular rende detenção de 1 a 3 anos. Pena em dobro se o crime for cometido por duas ou mais pessoas, ou pelo proprietário do animal, é outra novidade do PL. Crime culposo (sem intenção) será punido com três meses a um ano, além de multa. Há punições ainda para quem promover luta entre cães e para quem faz experiência dolorosa ou cruel em animal vivo - ainda que para fins didáticos ou científicos -, quando houverem recursos alternativos. O PL é de autoria do deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) e durante sua tramitação na Câmara ganhou emenda que abrandou penas em comparação ao texto original.
O autor do projeto argumenta que “o início da prática e o desprezo pela vida do outro se inicia na agressão contra os indefesos”, mas muitos que atuam na defesa dos animais acreditam que a severidade das sanções não inibirá agressores. “Aposto muito mais na educação e na conscientização. Já vejo a mudança de paradigma, pois os direitos dos animais vêm sendo levados mais a sério”, observa a delegada da Dema, Juliana Cavalcante, que exemplifica com o aumento no número de denúncias de maus tratos junto à divisão.
O advogado Lucas Bombonato, que atua na defesa dos direitos dos animais, faz ressalvas. “Entendo que o PL 2.833/11 é positivo, posto que as penas no Brasil são muito brandas e criam distorções. Por exemplo, uma pessoa que furta é mais penalizada que uma pessoa que mata um cão ou gato”, pondera.
A Lei de Crimes Ambientais define maus tratos como crime em seu artigo 32, mas não é cumprida. “A nossa Justiça deixa muitas brechas, isso é lamentável”, destaca a integrante da ONG Amor de Patas, Catarina Barbosa.
A omissão do Poder Público se soma à falta de estrutura dos órgãos que deveriam zelar pelo bem-estar dos animais. “Politicas Públicas até existem, mas só no papel. Se você precisar, de fato, de algum deles, vai ficar na mão”, diz Lucas, ao argumentar que a aprovação do PL 2.833/11 precisa vir acompanhada de políticas públicas de conscientização e meios adequados de efetivação das penas. “O objetivo deve ser a prevenção de crimes e não apenas a penalização do infratores”, acrescenta Bombonato. O PL foi encaminhado ao Senado Federal no final de maio e aguarda apreciação dos senadores.

Fonte/Foto: ORM News/Tarso Sarraf

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