USO DE BOTOS DO AMAZONAS COMO ISCA PARA PESCA PODE LEVAR À EXTINÇÃO
Botos-cor-de-rosa são
usados como isca para pesca na Amazônia
Levantamento feito pela pesquisadora Sannie Muniz Brum com
35 comunidades de pescadores em área de reserva de desenvolvimento sustentável,
na região do Baixo Rio Purus, no Amazonas, constatou que botos-vermelhos,
conhecidos também como botos-cor-de-rosa, estão sendo mortos e usados como isca
para a pesca do peixe piracatinga (Callophysus macropterus).
Sannie é pesquisadora do Instituto Piagaçu (IPI) e colaboradora da
Associação Amigos do Peixe-boi (Ampa). O projeto teve apoio da Fundação
Boticário de Proteção à Natureza. Sannie alerta que, no longo prazo, essa prática
pode acabar levando à extinção do "golfinho da Amazônia". "As
medidas têm que ser tomadas agora. Senão, é extinção", disse Sannie.
A coordenadora adjunta do
Centro Nacional de Pesquisa e
Conservação de Mamíferos Aquáticos (CMA) do Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio), Carla
Marques, disse que, em comitês internacionais, o governo brasileiro tem
sido cobrado sobre a preservação dos botos da Amazônia.
O problema, disse, é que
não há pessoal suficiente para exercer uma fiscalização contínua na região. O
ICMBio fiscaliza as áreas dentro das
unidades de conservação e o Instituto Nacional do Meio Ambiente e Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) se encarrega de fiscalizar fora dessas unidades. "Dentro
do instituto tem uma política de tentar evitar que ocorram essas práticas, mas
o ICMBio não tem o poder de polícia".
Carla Marques informou que têm sido feitas campanhas pelo
governo em conjunto com o Centro de Estudo e Pesquisa da Amazônia (Cepam). O
órgão do Ministério do Meio Ambiente tem conhecimento da utilização do golfinho como isca para
pesca, o que é ilegal, e está articulando ações para coibir a prática em
parceria com o Ibama e o próprio ministério. "A gente tem feito algumas
ações de fiscalização em conjunto com o Ibama, mas as ações são pontuais. A
Amazônia é um mundo inteiro. A gente não consegue coibir tudo".
Carla admitiu que esse é
um problema de difícil solução e que ocorre em outros países. Ela acredita que
para resolver o problema, só com fiscalização. "Está todo mundo pensando em tentar mitigar esse problema, mas é de difícil
solução pela falta de pessoal que se tem. Os dois órgãos têm pouco contingente
para atender a uma região como a Amazônia". Ela relatou, inclusive, que
algumas ações ocorrem em parceria com a
Polícia Federal e as polícias locais. "Mas são pontuais. A gente não
consegue estar presente o tempo todo. E a pesca continua".
Além de uma fiscalização
mais rigorosa e permanente, a pesquisadora Sannie Brum defendeu a necessidade de se levar às comunidades que
habitam em áreas protegidas informações para que saibam que é crime e ilegal
usar botos-vermelhos como isca para a pesca.
"É preciso que haja uma conscientização. Eles [pescadores] sabem
que é proibido, que não podem fazer". É preciso que haja uma coibição
efetiva para que decidam parar essa prática. "Educar e trazer informações
são medidas para a conscientização dos pescadores".
Segundo a pesquisadora, a
mortalidade é elevada na região do Baixo Purus devido à atividade de pesca da
piracatinga. Considerando 15 toneladas
pescadas somente na região, de acordo com relato dos próprios pescadores,
a estimativa é que até 144 botos-cor-de-rosa sejam mortos por ano para virar
isca. "É um absurdo".
A situação se agrava
considerando que os golfinhos têm uma reprodução lenta. As fêmeas têm uma
gestação de cerca de dez meses e, após o nascimento, podem cuidar dos filhotes
por até quatro anos. Com isso, a inserção de novos botos na natureza é
demorada. Sannie diz que a morte de uma grande quantidade desses animais pode
inviabilizar a manutenção da espécie.
Para a pesquisadora, a
fiscalização é importante, mas constitui
o primeiro passo. "Ela tem que ser mais efetiva e aberta à
discussão". Ela reiterou a necessidade de uma grande campanha de educação
ambiental nas comunidades, para que os moradores entendam a importância que o
boto tem para o meio ambiente e para ele mesmo. Hoje, disse, o pescador vê o
boto como um concorrente para suas atividades de pesca. "A gente precisa mudar isso. E só muda
com educação".
Sannie Brum pretende
começar uma nova pesquisa para descobrir o que pode ser usado como alternativa
de isca para a pesca da piracatinga. A
coordenadora adjunta do CMA, Carla Marques, informou que esse é um tipo de
peixe que se alimenta de carne morta ou em putrefação. Por isso, é rejeitado
como alimento pelos próprios pescadores.
Sannie Brum explicou que
apesar disso, eles vendem o produto
para mercados de São Paulo, do Paraná e
do Nordeste e, inclusive, para outros países, como a Colômbia. Para isso, usam o nome fantasia de
"douradinha". Como é vendido
sob a forma de filé, a piracatinga acaba sendo comprada pelos
consumidores que o confundem com um peixe nobre, a dourada (Brachyplathystoma
flavicans).
Fonte/Foto:
Alana Gandra – noticias.uol.com.br
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