CUMARU – MUITO ALÉM DO BANHO DE CHEIRO
O nome científico da
espécie já é uma boa pista do uso principal do cumaru. Em latim, Dipteryx
odorata faz referência ao formato das flores (Dipteryx= duas asas) e à forte
fragrância (odorata=perfumado, aromático) que exala das sementes e da madeira.
Desde o século 19, perfumistas e fábricas de tabaco internacionais adicionam
notas de cumaru a perfumes sofisticados, charutos e fumo para cachimbo, para
obter um toque de baunilha meio acanelado. Também é muito antiga a venda de
preparados com cumaru, no mercado do Ver-o-Peso, em Belém (PA), para os
tradicionais banhos de cheiro.
Mas o potencial dessa
árvore de 30 metros de altura, nativa da Amazônia e do norte do Cerrado e
Pantanal, não se restringe ao sentido do olfato. O cumaru ainda dá o ar de sua
graça em bolos e doces da cozinha paraense; bombons finos ou em sobremesas
preparadas por chefs-confeiteiros badalados, fazendo a festa do paladar. Até
cerveja de cumaru existe, fabricada pela Cervejaria Amazon Beer, do Pará, com
uma distribuição que começa a ganhar outras regiões do Brasil. Segundo Caio
Guimarães, responsável pela produção, a cerveja ganha um aroma de especiarias
com o acréscimo de seu ingrediente amazônico.
Tanto os aromatizantes
como as experiências gustativas são feitos com as sementes, extraídas de dentro
de um fruto pouco maior do que um ovo, com polpa bem firme e casca pardacenta.
Cada fruto tem apenas uma semente e são necessárias cerca de 60 sementes para
completar um quilo. Quando prensadas, as sementes produzem um óleo fixo “muito
forte e muito caro”, diz o químico Luiz Roberto de Morais, da Amazon Oil, de
Ananindeua (PA). Os óleos fixos são aqueles que não desaparecem quando em
contato com o ar, permanecem líquidos ou pastosos. São diferentes dos óleos
essenciais, bem mais voláteis.
O tal óleo fixo aromático
corresponde a cerca de 30 a 40% das sementes. Depois de purificado, é vendido
em vidrinhos de 100 ml que custam cerca de R$ 160,00. “A produção é 100%
extrativista e esse preço se deve ao custo, que é alto mesmo”, complementa
Morais. “Em compensação é só usar uma gota e já é suficiente para aromatizar o
ambiente ou para fabricar o perfume, o cosmético”.
Na região Norte, os
coletores de cumaru competem com os fabricantes de barcos, interessados na
excelente durabilidade da madeira de cumaru para fazer as cabines de suas
embarcações. Com alto teor de sílica e alta densidade, essa madeira resiste bem
ao calor, ao sol e à chuva. E o cheiro – agradável aos passageiros – ainda
afasta cupins e outros insetos-praga. Tem gente, inclusive, que usa pedacinhos
de madeira ou sementes de cumaru dentro dos armários e nas estantes de livros,
para afastar traças e evitar mofo.
Mais? Pois tem mais, sim:
uma substância presente no óleo de cumaru – a cumarina – age contra varizes,
hemorroidas, úlceras nas pernas e flebites. Vários medicamentos comerciais para
prevenção e tratamento de varizes, disponíveis no mercado, são compostos de
cumarina com troxerrutina. Conforme estudos clínicos realizados em 2011 pelo
pesquisador Cid José Sitrângulo Jr., da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo (FM-USP), a combinação dessas duas substâncias é considerada
eficaz e segura em pacientes com insuficiência venosa crônica ou IVC (que dá
origem às varizes).
O mesmo óleo de cumaru
contém também isoflavonas, conforme caracterização feita pela química Mirian V.
Lourenço, da unidade de Biotecnologia da Universidade de Ribeirão Preto
(Unaerp). As isoflavonas, explica ela, “são compostos orgânicos naturais, de
origem vegetal, muito semelhantes aos hormônios femininos (como o estrogênio)
usados para reposição hormonal, na fase de menopausa”. O estudo ainda está
muito no início, mas há potencial para se desenvolver algo semelhante às
isoflavonas de soja, hoje usadas pelas mulheres em lugar de hormônios
sintéticos.
Constatadas as mil e uma
utilidades do cumaru, falta apenas promover a adoção em massa dessas árvores
nas roças e nos quintais de todo o país, visto que a demanda é crescente e o
plantio comercial sempre é uma alternativa mais racional. Pesquisadores da Embrapa
e cooperados de comunidades amazônicas – como a Avive, de Silves (AM) –
editaram cartilhas e manuais para ensinar a plantar e colher o polivalente
aromático. Basta seguir as instruções. Alguns textos até avisam que a semente
germina bem mesmo se armazenada por 4 anos! Deve ser uma das razões pelas quais
a espécie também é chamada de cumaru-ferro!
Fonte/Foto: Liana
John – planetasustentavel.abril.com.br/Amazon Oil
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