ARTIGO | É O COMBATE ÀS FAKE NEWS, ESTÚPIDO!
Não é perseguição ou
censura à liberdade de expressão, mas sim a contundente luta contra a indústria
das fake news. As ações do Supremo Tribunal Federal (STF), as denúncias de
entidades da sociedade civil, e até as medidas tomadas por pequenos grupos
digitais são respostas necessárias contra um mal que vem contaminando a saúde
da boa informação. A tecnologia e os meios de comunicação são as lentes que
usamos para contemplar a realidade do mundo. A quantidade imensa de
acontecimentos diários relevantes para nossa vida e a importância de ter uma
boa filtragem e seleção dos fatos, a distância entre onde eles ocorrem e onde
vivemos são fatores que reforçam nossa dependência dos meios. Quando interesses
escusos e quadrilhas começam criminosamente a alterar o grau ou opacidade desta
lente e vidas entram em risco, é importante entender a gravidade de uma curtida
e de um compartilhamento na rede.
A distorção de valores
se acentua no desabafo presidencial de que a imprensa que o defende é
perseguida. Se defende, não é imprensa. Este não é o papel do jornalismo,
defender interesses de indivíduos, mas sim o de lutar pela verdade e atender ao
interesse público. Esta mesma ideia patrimonialista da imprensa e dos meios é
que respalda a ideia de que o que me conforta ou o que me reafirma é que é a verdade.
O resto, é plano de “esquerdalha” para dominar o mundo. Neste enredo ficcional,
o que não é ilusão é o resultado de reenviar para seus pares um vídeo mentiroso
ou uma “notícia” que distorce a realidade.
Não há inocência no
compartilhamento de um vídeo que causa o linchamento e a morte de uma mãe de
família, no boato que faz com que idosos caiam na lábia de quadrilhas e percam
a pouca aposentadoria que recebem, nas fake news que fazem com que as pessoas
se automediquem e se exponham à morte, na mentira que desonra a imagem de
indivíduo e causa o suicídio. Os exemplos reais da brutalidade são muitos, e
estão ao acesso de qualquer pesquisa na internet. Não é só uma brincadeira
quando coloca a ciência e o campo da saúde em descrédito, promovendo um cenário
de desinformação que ceifa a vida de milhares de pessoas. Também não é válido
ou moralmente defensável só porque concordamos ou por ser vantajoso em uma
discussão na internet. O “reenvio” irresponsável é um gatilho que destrói os
sonhos e a vida de famílias.
É contra este tipo de
abominação e contra quadrilhas das fake news, que curiosamente mantêm relações
escandalosas e execráveis com grupos que estão em diversos governos, que são
urgentes medidas reais de coação e combate. Questionável ou não, do ponto de
vista jurídico a competência do STF para deflagrar investigação sobre o tema,
fato é que ação escancara os agentes públicos, os atores e influenciadores
digitais e os financiadores que estão coadunados com a desinformação e com os
interessados em tirar proveito do caos promovido com as fake news. Na prática,
o que se reforça é que o direito de se manifestar não corre longe à obrigação
de se responsabilizar pelo discurso que opera. Além disso, se para uns a medida
atende interesses corporativos para responsabilizar quem macula a imagem de uma
das mais importantes instituições democráticas do país, para outros, o mérito
também reside em dar cara, nome e endereço eletrônico de quem cria a
desinformação e mantém e alimenta a rede de robôs que propaga fake news.
Da mesma forma, mas com
ferramentas distintas, vemos surgir ações na sociedade civil como a Sleeping
Giants, que vem desvendando uma das faces mais absurdas das estratégias de
alimentação do mercado das fake news, que é sua forma de sustento. Sites que
surgem com a única função de promover a desinformação são financiados por
grandes empresas, algumas delas, pasmem, de administração pública, como o caso
do Banco do Brasil. A simples ação de ir às redes sociais e publicar nas
páginas destas empresas que elas estão financiando fake news tem gerado um
impacto imenso na rede, e atacando na fonte das quadrilhas. Absurdo, em meio a
isso, é perceber, no caso do Banco do Brasil, um esforço do governo, a partir
da secretaria de comunicação, e de familiares da presidência, em remar contra a
maré e continuar “aplicando” recurso público nestes sites de propagação de
mentiras.
A única coincidência
entre a deflagração dos inquéritos do STF e das denúncias da Sleeping Giants é
a simultaneidade. De resto, são medidas que, quer seja no seio do poder público
judiciário quer seja na sociedade civil, demonstram que a guerra contra as fake
news e as quadrilhas que atuam em meio ao caos da desinformação não pode ficar
apenas no discurso, e deve ganhar ares de concretude. O resultado imediato e
palpável, neste momento, é o de fazer recuar os que acham que podem escrever e
compartilhar o que bem entendem na rede sem que a Polícia Federal bata na porta
das suas casas às tanta de uma manhã qualquer; ou ainda que as empresas que se
preocupam com a imagem institucional retirem o respaldo financeiro dos sites de
desinformação.
Num amanhã possível, o
resultado que se espera é que a repercussão promova uma legislação mais efetiva
para criminalizar tais atos, e que a sociedade deixe de enfrentar com
normalidade o compartilhamento de “notícias falsas”. Em alusão ao mote da
campanha presidencial dos EUA na década de 1990, que escancarava o eixo
importante daquela disputa de urna, "It's the economy, stupid", a
tônica da atualidade em meio à pandemia de de desinformação é “É o combate às
fake news, estúpido!”.
Autor: Alexsandro Ribeiro é professor nos
cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Centro Universitário
Internacional Uninter.
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