EM 18 ANOS | PLANTA CONHECIDA COMO 'UVA DA AMAZÔNIA' FRUTIFICA EM MANAUS PELA 2ª VEZ
Responsável pela maior folha do mundo, segundo o Guinness, a Coccoloba
chega a produzir cerca de dois mil frutos
Ainda
rodeada de mistérios, um dos exemplares da planta Coccoloba, cultivada no
campus do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus,
frutificou pela segunda vez em 18 anos, após um hiato de um ano, o que pode
representar um avanço nas pesquisas não só em relação ao seu “comportamento” na
natureza, como também nos benefícios que seu fruto pode trazer para as pessoas.
A
colheita da segunda leva de frutos maduros da Coccoloba (chamada carinhosamente
de “Uva da Amazônia”) foi acompanhada com exclusividade pela equipe de A
CRÍTICA no campus III (V8) do Inpa, localizado no conjunto Morada do Sol,
Aleixo, Zona Centro-Sul de Manaus. Em uma primeira degustação, o sabor do
pequeno fruto pode lembrar uma pitomba ou até mesmo uma azeitona roxa: travoso e
levemente cítrico. A primeira frutificação foi registrada em agosto de 2017,
após 17 anos de cultivo, o que possibilitou o início de experimentos mais
detalhados em relação à germinação das sementes e as potencialidades
nutricionais do fruto.
Há
22 anos registrada no “Guinness Book” como a maior folha do mundo já catalogada
por chegar a ter 2,50 metros de comprimento por 1,44 metro de largura, a
Coccoloba foi descoberta em uma expedição pela bacia do Rio Madeira, nas
proximidades de Borba (distante 151 quilômetros de Manaus), pelo pesquisador do
Inpa, Carlos Alberto Cid Ferreira.
“A
Coccoloba é uma planta que chega a 13 metros de altura e produz cerca de 2 mil
frutos. Após oito anos de cultivo no campus do Inpa, ela floresceu, em 2013. Em
agosto de 2017, ela frutificou”, detalhou Cid Ferreira.
O
pesquisador Jaime Aguiar, do laboratório de análise de alimentos do Inpa, foi
quem chefiou a equipe responsável por iniciar a análise nutricional dos frutos
da Coccoloba. “É um fruto ainda pouco explorado. Quando fiz as primeiras
análises da polpa, vi que tinha bastante fibras solúveis e insolúveis. O
mineral que predominou bastante foi o potássio e o magnésio. Tem também as
vitaminas C (o que explica o leve azedume), A e do complexo B. É um fruto muito
benéfico para as pessoas”, explanou.
Uma
observação registrada na primeira coleta dos frutos foi que alguns passarinhos,
como os bem-te-vis, foram vistos comendo os frutos. A hipótese é que outros
pássaros também se alimentem da espécie e que, possivelmente, eles possam ser
os dispersores da Coccoloba na região de Manaus. “Expandi a pesquisa com alguns
colegas pesquisadores para que, cada um na sua área de conhecimento, ajudasse a
desvendar os mistérios da Coccoloba. Um assunto vai puxando outro”, diz Cid
Ferreira.
Planta tem folhas menores que as vistas em área nativa
O
que contribui para esta árvore, da família Polygonaceae, ser cercada de
mistérios que ainda intrigam os cientistas
é que não há registro da Coccoloba fora do seu ambiente nativo, na bacia
do Rio Madeira. Tanto que a espécie começou a ser cultivada em 2005 no campus
do Inpa, em Manaus, e após florescer em 2013, só frutificou pela primeira vez
quatro anos depois, em 2017, voltando a dar frutos esse ano (em 2018 apenas
floresceu).
Segundo
as primeiras análises dos exemplares cultivados em Manaus, a Coccoloba, além de
fazer a fotossíntese natural, tem a capacidade de armazenar, em suas grandes
folhas, energia durante a ausência de luz, ou seja, à noite. Outro detalhe
observado, até aqui, é que as folhas das plantas cultivadas em Manaus não
chegaram a alcançar o tamanho impressionante de suas “irmãs” da bacia do rio
Madeira. Por variadas razões, tais como a diferença de solo, de polinizador e
de ambiente, essas mudanças já eram esperadas pela equipe de pesquisa.
“Ela
não tem essa capacidade de nascer espontaneamente na Amazônia central”,
esclareceu Cid Ferreira, considerado pela comunidade científica como o maior
coletor de plantas herborizadas da Amazônia brasileira por, em 30 anos de
pesquisa, ter coletado aproximadamente 14 mil folhas para o herbário do Inpa,
entre elas pelo menos 20 espécies amazônicas novas.
Armazena energia durante o dia e faz fotossíntese a noite
Segundo
o pesquisador Cid Ferreira, a Coccoloba já pode ser considerada um fenômeno da
natureza por ser uma planta de caule lenhoso, conseguir levar os nutrientes do
solo até suas folhas e desenvolvê-las até chegarem a um tamanho
impressionante. "Diferentemente das
plantas comuns, a Coccoloba armazena energia durante o dia e realiza a fotossíntese
durante a noite também", disse.
A
espécie foi encontrada em matas secundárias das margens do rio Canumã, afluente
do rio Madeira, próximo a Borba, em 1983, após uma expedição do projeto
intitulado “Flora Amazônica” - uma parceria entre o Inpa e o Jardim Botânico de
Nova York. Anos mais tarde, em 1993, pesquisadores do Inpa e do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama),
realizaram outra excursão à Floresta Nacional do Jamari, em Rondônia, onde
foram coletadas, de uma única espécie, duas folhas que mediam respectivamente
2,50 metros de altura por 1,44 metros de largura, e 2 metros e 10 centímetros
de altura por 1 metro e 32 centímetros de largura.
As
amostras, na época da coleta, pesavam cerca de 840 gramas (a folha de uma
árvore mais conhecida mal mexe o ponteiro de uma balança). Elas estão
registradas e catalogadas no acervo científico do herbário do Inpa e fazem
parte de uma exposição científica permanente da Casa da Ciência, no Bosque da
Ciência, onde é uma atração turística à parte.
Sem nome tradicional
Sem
um nome vulgar (nem entre os indígenas), a Coccoloba é chamada pelo nome latino
que designa as espécies da família
“polygonaceae”, encontradas, sobretudo, em regiões tropicais e
subtropicais da América do Sul e da América Central. Com o registro da primeira
inflorescência e frutificação, a espécie amazônica começou a receber estudos
taxonômicos para a identificação completa da espécie. Concluída essa parte do
estudo, uma das sugestões de nome para essa planta amazônica seria Coccoloba
Inpae, em homenagem ao Inpa.
Fonte/Foto: Luiz G. Melo – A Crítica/Junior Matos
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