TEATRO AMAZONAS PELA PRIMEIRA VEZ VAI RECEBER COMO PROTAGONISTA CANTORA INDÍGENA
A cantora indígena e graduanda em jornalismo,
Djuena Tikuna vai realizar no dia 23 de agosto no Teatro Amazonas o lançamento
de seu primeiro CD, o álbum Tchautchiane que quer dizer ''Minha Aldeia''
e fez uma campanha de financiamento coletivo na internet para ajudar no transporte de indígenas
de diferentes etnias. O que muita gente não sabe é que ela é a primeira
indígena a realizar um evento como autora no local, considerado por muito tempo
um espaço para elite de uma Manaus que tentava renegar sua origens.Ela já
participou como convidada em algumas apresentações como outros indígenas mas
nunca como autora.
''Somos diferentes povos, mas somos todos parentes.
Fomos todos pescados no mesmo Eware, navegamos a mesma Cobra Grande. Esse é um
momento que quero dividir com os parentes, mostrar a união dos povos indígenas
pela cultura que é a nossa maior identidade. A ideia é celebrarmos, juntos, essa
resistência cultural.'', esclarece.
Além de simbólica e histórica a presença de Djuena
como protagonista é um grito de resistência de uma celebração com vitória para
os povos indígenas do Amazonas que viveram por muito tempo os efeitos da época
da borracha. Inaugurado em 1896 o Teatro Amazonas de uma Manaus que passou
seguir os moldes de cidades europeias, sendo considerada em 1910 a capital
mundial da borracha por causa do enriquecimento pelos seringais. O preconceito
com tudo que não era europeu ou chique o suficiente como o que vinha de Paris
tentava tornar invisível a verdadeira face de Manaus, a dos povos da floresta,
com seus costumes, artes, cores, danças, línguas, culturas e toda beleza dos
originários amazonenses.
''Mas a arte não tem classe social e nem etnia. Ela
é de todos, como o sol também é. Todos têm direito à arte, seja indígena ou
não. Podemos querer assistir um Festival de Ópera no Teatro Amazonas, como
também querer prestigiar um espetáculo cultural que nos represente. O
protagonismo não é individual, ele representa a coletividade daqueles que
acreditam na importância de valorizarmos a nossa cultura.'', afirma a cantora.
Com apoio de indígenas, amigos e da Coordenação das
Organizações Indígenas da Amazônia - COIAB, ela segue na busca de parcerias.
"Apoio mesmo que conto é com o dos parentes.
Eles que aceitaram o convite de participarem comigo nesse dia, mostrando seus
cantos, é o principal apoio que recebemos. Contamos com o apoio institucional
da COIAB, vamos inclusive divulgar esse trabalho na Assembleia da Coiab que
acontece no final de agosto no Pará, na terra dos parentes Tembé. Alguns amigos
e parceiros tem contribuído com o processo como a Cia. De Teatro Vitória Régia,
do querido Nonato Taveres, artista amazonense que tem sido um grande formador
de gerações. Outros parceiros vão aparecendo como a Secretaria de Cultura do
Amazonas, que nos disponibilizou o Teatro Amazonas e o edital de artes PROARTE,
que nos proporcionou a produção de parte do CD. Outros parceiros, como o Greenpeace
e o CMA – Comando Militar da Amazônia vão colaborando pontualmente. Mas
qualquer pessoa que compartilha o link da campanha eu considero apoio.",
diz Djuena.
LINK DA CAMPANHA - https://partio.com.br/projeto/djuena-tikuna-celebra-seu-primeiro-disco-no-teatro-amazonas
Em Abril de 2017 ela participou da campanha musical
“Demarcação Já” de Carlos Rennó e Chico César. Gravada com Maria
Bethânia, Gil Gilberto, Ney Matogrosso, Criolo, Zeca Baleiro, Tetê Espíndola,
Dona Onete, Marlui Miranda, Margareth Menezes, Céu, Zeca Pagodinho, Zeca
Baleiro, Nando Reis, Arnaldo Antunes e outros convidados.
"Quem quiser pode contribuir com o
financiamento coletivo que tem o objetivo de trazer algumas das comunidades
indígenas de Manaus e do entorno para o evento, bem como viabilizar a vinda de
outras lideranças indígenas e culturais como o Akari Wauja, lá do Xingu e a
Sonia Guajajara. Queríamos trazer outras lideranças de fora, mas como não temos
recebido tanto apoio vamos priorizar os parentes daqui. Enfim, todo apoio é bem
vindo.'', convida.
Seus cantores favoritos são Pedro Inácio Tikuna,
Cintia Guajajara, Cláudia Tikuna, grupo Wotchimaücü, entre outros. Ela gosta de
Salif Keita, um cantor africano albino que sofreu muito preconceito e é
descendente do fundador do Império Mali. Salif desafiou as regras culturais de
seu povo ao se tornar cantor. Também é fã do trabalho da Marlui Miranda,
inclusive vai ser uma das convidadas no dia do lançamento.
''Tenho escutado a música dos parentes Yawanawa,
quero um dia ir no Festival deles, também gosto do Toré dos parentes do
nordeste.", comenta.
Djuena cujo nome significa ''a onça que pula no
rio", comentou como aprendeu suas primeiras canções na cultura Tikuna com
seus familiares.
"Geralmente as crianças Tikuna aprendem os
cânticos com seus pais e avós, que cantam canções de ninar específicas. 'Peri
paperi mimi napë, Murucutu napë'. Quando coloco meu filho pra dormir é com
essas cantigas. Nesse momento também me vem inspiração pra compor minhas
próprias melodias. Como minha mãe também é cantora, sempre tivemos acesso à
cantoria. Mas a minha primeira composição própria foi a canção Yoi Tüna
Pogü que conta a origem do povo Magüta que é autodenominação dos Tikuna. Ai eu
já estava cantando com meus irmãos na antiga feira Puka’a que acontecia no
Centro Histórico de Manaus e reunia vários grupos indígenas vendendo seus
artesanatos, suas produções, cantando, dançando, interagindo. Esses dias
o meu irmão foi eleito para compor o Conselho de Cultura Municipal aqui em Manaus,
uma vitória do movimento indígena local, e um de seus compromissos é reviver a
Feira Puka’a.", explica.
Hoje é uma das cantoras indígenas de maior destaque
no país. Djuena Nonato Tavares entra para história como uma artista que ousa
valorizar sua cultura, povo e canto ancestral trazendo para o palco sua arte
junto da resistência tikuna. Como canta em seu canto Maiyugü wüiguü,somos
parentes e celebra união de todos povos. Este é seu maior desejo no palco do
Teatro Amazonas, como um sonho coletivo em que representantes indígenas de
diferentes aldeias possam participar deste momento.
Fonte/Foto: Renata Machado - www.radioyande.com / Diego Janatã
Nenhum comentário:
Postar um comentário