ARTIGO DEDOMINGO: BELO MONTE SERÁ CHINESA?
- por Lúcio Flávio Pinto (*)
O
Estado de S. Paulo anunciou, anteontem, que o controle acionário da
hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, está à venda. O jornal
obteve informações de que os principais acionistas da Norte Energia,
concessionária que administra a usina, já contrataram o Bradesco BBI e buscam
com um banco internacional para buscar potenciais investidores no Brasil e no
exterior.
A
oferta de venda seria das ações da estatal mineira Cemig, da Light,, dos fundos de pensão Petros (da Petrobrás) e
Funcef (da Caixa), da mineradora Vale, da siderúrgica Sinobras, de Marabá, e da J. Malucelli. Em conjunto, elas detêm
50,02% da Norte Energia.
Segundo
o jornal paulista, o valor patrimonial de Belo Monte, projetada para ser a
terceira maior hidrelétrica em capacidade instalada do mundo, é estimado em 10
bilhões de reais. A conclusão das obras será em 2019, quando todas as suas 18
turbinas gigantescas estarão funcionando, em condições de gerar (no auge do
período de chuvas) 11.233 megawatts (MW) de energia. Essa etapa ainda exigirá
mais R$ 5 bilhões, pelo menos.
O
jornal diz que nessa etapa final, o custo de Belo Monte será de mais de R$ 31
bilhões, a partir de uma previsão inicial de R$ 18 bilhões. Desse total, R$ 22
bilhões foram financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social, do qual a Norte Energia ainda espera receber mais R$ 2 bilhões. O
eventual comprador assumirá desse débito.
Segundo
a notícia, “por ora, a participação do Grupo Eletrobrás, de 49,98%, não está à
venda. Mas, como a estatal tem o direito de “tag along” (mecanismo que permite
ao minoritário vender suas ações pelo preço pago ao controlador), o grupo
também poderia vender sua fatia na hidrelétrica, diz uma fonte do setor, caso o
valor seja satisfatório”.
Informa
o Estadão que “antes mesmo da contratação do banco que vai liderar a
negociação, algumas chinesas – que são consideradas “candidatas” a qualquer
processo de fusão e aquisição no País – já vinham sondando o empreendimento.
State Grid e China Three Gorges – que estão há mais tempo no Brasil e
abocanharam importantes ativos no setor de energia, como Cesp, CPFL e Duke
Energy – já começaram a avaliar a usina. A State Grid, por exemplo, está
construindo o linhão que vai distribuir a energia de Belo Monte”.
A
previsão dos informantes é de que venha a ser formado um ou mais consórcios,
indicando que a disputa no leilão será acirrada, apesar de um complicador: os
investigadores da Operação Lava Jato receberam informações sobre o pagamento de
propina a políticos por parte do consórcio construtor de Belo Monte, formado
pelas empreiteiras Odebrecht, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz
Galvão, OAS e outras cinco empresas menores, também participantes do esquema de
corrupção na Petrobrás.
“Há
uma enorme preocupação por parte dos investidores que têm negociado ativos de
empresas envolvidas na Lava Jato de que o escândalo acabe respingando nos
futuros controladores. Se o valor da multa já está estipulado, coloca-se no
preço. Caso contrário, a incerteza é grande”, disse ao jornal um advogado, que
preferiu não se identificar.
Outro
entrave por ele apontado “é o modelo financeiro adotado em Belo Monte.
Analistas que acompanham o projeto afirmam que o retorno do investimento caiu
pela metade nos últimos anos por causa das paralisações e multas aplicadas por
atraso nas obras”.
Embora
algumas informações citadas no texto não estejam corretas, a transferência do
controle acionário de Belo Monte dá razão aos raros que apontavam a
inviabilidade econômica do empreendimento. A elevação exagerada do seu custo
final, por diversos fatores, complicou o retorno do investimento através da
receita operacional. A usina teria que funcionar por bastante tempo com
prejuízo. As empresas dispostas a passar em frente as suas ações não querem ou
não podem suportar esse ônus.
Um
novo controlador o assumirá? Os chineses, talvez. Pela regra das suas
negociações, porém, desde que haja compensações e vantagens tanto no negócio de
energia quanto nos interesses paralelos ou convergentes que possuem ou pensam
ter. Caso a transação ocorra, eles se tornarão donos tanto da geração da maior
hidrelétrica do Brasil quanto das linhas de transmissão de energia.
Não
é, portanto, apenas uma operação comercial. Toca em interesses superiores do
país. Por isso, tem que ser acompanhada pela sociedade.
- (*) Lúcio Flávio Pinto é jornalista profissional desde
1966. Percorreu as redações de algumas das principais publicações da imprensa
brasileira. Durante 18 anos foi repórter em O Estado de S. Paulo. Em 1988
deixou a grande imprensa. Dedicou-se ao Jornal Pessoal, newsletter quinzenal
que escreve sozinho desde 1987, baseada em Belém.
No
jornalismo, recebeu quatro prêmios Esso e dois Fenaj, da Federação Nacional dos
Jornalistas. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças
sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace e, em
2005, o prêmio anual do CPJ (Comittee for Jornalists Protection), de Nova York.

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