SABORES PARAENSES DÃO A BELÉM RECONHECIMENTO MUNDIAL NOS 400 ANOS
Principal ingrediente da maniçoba, um dos pratos
típicos mais consumidos em Belém, a maniva é triturada no Ver-o-Peso sob os
olhos atentos dos turistas
“A gente está tendo, com a nossa gastronomia,
a volta do que a gente chama de paraensismo, do orgulho de ser paraense. O
destaque que a gente teve no último ano, com a divulgação do nosso estande na
ExpoMilão, inclusive em mídia nacional, teve uma repercussão muito grande na
autoestima do paraense. O relato que a gente ouvia das pessoas era: ‘Poxa,
Belém está tendo uma divulgação que enfim merece, estão vendo toda a nossa
riqueza’. A gente só vai fazer algo por nossa terra se acreditar nela. Isso é
importante nesse cenário brasileiro, em meio a essa crise”. A opinião
emocionada da diretora executiva do Instituto Paulo Martins, Joana Martins,
expressa o sentimento despertado no paraense graças à rica gastronomia de
Belém, que ganhou reconhecimento internacional e local com novos projetos neste
ano em que a cidade faz 400 anos.
“O Pará está indo na
contramão do cenário nacional. Passamos a acreditar mais no nosso Estado, e que
bom que é por meio da gastronomia”, reforça Joana Martins. O instituto que leva
o nome de seu pai – que morreu em 2010 – tem a missão de fomentar o sonho de
Paulo Martins, um dos mais famosos chefes de cozinha paraenses: fazer da
culinária amazônica um patrimônio regional, reconhecido internacionalmente.
No ano em que completa 400
anos, Belém começa a ganhar, a partir de julho, o Centro Global de Gastronomia
e Biodiversidade. A proposta de criação do espaço, que faz parte das
comemorações dos quatro séculos de fundação da cidade, foi apresentada ao
Governo do Pará e à Prefeitura de Belém por um conjunto de organizações da
sociedade civil, lideradas pelo Instituto Paulo Martins (entidade que promove e
divulga a gastronomia paraense e amazônica e que organiza anualmente o festival
Ver-o-Peso da Cozinha Paraense), o instituto Atá (principal instituição
brasileira que trabalha a relação homem-alimento, presidida pelo chef Alex
Atala) e o Centro de Empreendedorismo da Amazônia (fundado em 2015 com o
objetivo de estimular a inovação na região).
Com o centro, que vai
funcionar no Complexo Feliz Lusitânia, a ideia é que Belém possa oferecer ao
Brasil e ao mundo um espaço onde pesquisadores, profissionais e estudantes
possam fazer trabalhos de pesquisa, ensino e formação. O centro vai incorporar
cinco unidades específicas, que vão abrigar atividades de promoção da cultura
gastronômica por meio de uma escola superior, um laboratório de alimentos,
barco-cozinha, museu e restaurante. Em julho deste ano, o barco-cozinha já vai
estar ancorado na Baía do Guajará, em frente ao complexo. Até o fim de 2016, o
restaurante do Centro de Gastronomia já estará funcionando, e a inauguração
será concluída em 2017.
Reconhecimento – O projeto
de criação do Centro de Gastronomia e Biodiversidade, lançado para um público
de mais de 150 países, durante a Expo Milão, em outubro do ano passado, foi
ainda mais valorizado pela escolha de Belém, em dezembro de 2015, em Paris,
como cidade-membro da Rede de Cidades Criativas da Organização das Nações
Unidas para a educação, a ciência e a cultura (Unesco). Foram escolhidas 48 cidades
de 33 países, que se tornaram símbolo
pelo mundo em sete campos criativos: artesanato e arte popular, design, cinema,
gastronomia, literatura, artes de mídia e música.
Além de Belém, com a
gastronomia, apenas mais duas cidades do Brasil aparecem na lista: Salvador
(BA), no campo criativo da música, e Santos (SP), no cinema. “Esse é um selo
muito importante, porque insere Belém no contexto das Nações Unidas e demonstra
que a gente não está trabalhando sozinho. Quando falamos em gastronomia,
falamos de uma enorme cadeia produtiva, das mulheres que produzem o cacau para
o chocolate até o chocolate gourmet. A gastronomia paraense não traz só o
refinamento do paladar; ela tem por trás a antropologia, a história de vidas de
famílias, até chegar à mesa”, disse na ocasião do anúncio a secretária
extraordinária de Estado de Integração de Políticas Sociais, Isabela Jatene.
Negócios – Entre as
famílias paraenses beneficiadas pela valorização da gastronomia local está a de
Lucilene Torres, 51 anos. Vinte anos atrás, ela vendia churrasquinho na feira
do Ver-o-Peso, mas o negócio não deu certo e a comerciante resolveu, então,
desenvolver seus dotes na cozinha com a construção de um boxe para a venda de
comidas típicas. O local virou o “boxe da Lucia”, um dos mais concorridos entre
as 56 barracas que ocupam a praça de alimentação da maior feira a céu aberto da
América Latina.
De segunda a quinta-feira,
Lucilene vende de 60 a 70 refeições por dia; são 100 às sextas e sábados. O
prato mais procurado pelos turistas é o tradicional açaí com peixe frito. “Isso
aqui é a minha vida. Sou apaixonada pelo que eu faço. Temos a melhor comida do
mundo, e me orgulho muito de poder apresentá-la para tanta gente de fora”.
A vida de Edmilson Chaves,
65 anos, também mudou com a comercialização de comida regional. Depois de
trabalhar 20 anos como pedreiro, ele resolveu ajudar o cunhado na venda de
tucupi no Ver-o-Peso. O negócio deu tão certo que as obras ficaram para trás, e
hoje ele se gaba de ser um dos maiores vendedores de cachaça de jambu, uma
iguaria exótica que atrai os turistas. “Todo mundo vem aqui querendo sentir o
beiço tremer. Os turistas chegam até com intérprete para conhecer melhor e
adquirir meus produtos”, diz ele, orgulhoso.
O ritual de triturar a
folha da maniva, que vai ser armazenada em sacos e, depois, fervida durante
dias para se transformar na cada vez mais conhecida maniçoba, também fascina os
turistas. “Eles param sempre aqui para ver a gente moer a maniva. Ficam
espiando, gostam e vão comprar nos restaurantes”, conta Ademilson Trindade,
vendedor de maniva há 30 anos no Ver-o-Peso. Ademilson, Edmilson e Lucilene
estão entre os milhões de paraenses que festejam o aniversário de Belém com o
reconhecimento do que há de mais genuíno, saboroso e cada vez mais lucrativo no
Pará: a culinária regional.
Fonte/Fotos:
Agência Pará de Noticias
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