'PELA 1ª VEZ SINTO QUE PERTENÇO A ALGUM LUGAR', DIZ AMAZONENSE ADOTADO POR HOLANDESES
Agosto Alfredo entre Liza e a mãe, Anna (à direita) |
Agosto Alfredo da Matta Kampen diz estar muito à
vontade em Manaus e afirma que crianças adotadas nas mesmas condições dele
crescem com bloqueio e tendem a procurar os pais biológicos na vida adulta
“Muita gente pensa que, para uma criança
pobre, ser adotada por uma família rica, de estrangeiros, é a melhor coisa que
pode acontecer. Mas não é bem assim”. A frase de Agosto Alfredo da Matta
Kampen, 30, retrata bem a realidade de muitas crianças que, após abandonadas
pela família, são encaminhadas para a adoção internacional. E traduz um drama
que, na vida dele, ganhou proporção na adolescência.
A infância, lembra ele,
foi feliz e saudável em Amsterdã, com outros três irmãos - dois filhos
biológicos dos pais adotivos e um terceiro, também adotado. Foi quando ele
tinha 15 anos que a curiosidade pelo passado despertou e surgiu a ideia de
conhecer a mãe biológica. “Antes disso foi tudo lindo. Até os 10 anos minha
vida foi normal. Quando eu comecei a crescer é que comecei a notar que eu era
diferente dos outros, mais moreno, com outros traços, e me sentir um estranho.
Não me sentia à vontade em lugar nenhum”, lembrou Alfredo.
A rebeldia, típica dos
adolescentes, nele tomou uma proporção ainda maior, dado o histórico de
abandono e adoção e o fato de não conhecer a própria origem. O resultado foi
uma emancipação precoce: aos 18 anos ele saiu de casa “para ter liberdade”.
Revirando o passado
Com o tempo, o interesse
de Alfredo pelo passado cresceu, até que, há cinco anos, ele tomou a decisão de
procurar pela mãe biológica. “Crianças que são adotadas nessas condições
crescem com um bloqueio. Chega uma hora que elas querem saber sobre seu passado,
sua história, sua família, sua origem”, explicou Liza Silva, 30, da ONG Pessoas
Desaparecidas Brasil - Holanda, uma “parceira” de Alfredo nessa busca pela mãe
biológica.
E foi o contato com Liza
que mudou o rumo dessa procura de Alfredo. Eles se conheceram há pouco mais de
um ano e meio e, desde então, vêm promovendo uma verdadeira “força-tarefa” nas
redes sociais e na mídia holandesa - e agora na brasileira - para divulgar a
história de Alfredo e, assim, localizar a família da mãe biológica dele. Quando
as primeiras informações surgiram, Alfredo e a família trataram de juntar
dinheiro para a tão esperada viagem de volta a Manaus. “Conseguimos contato com
algumas pessoas daqui, que nos ajudaram a divulgar a história do Alfredo e
agora viemos na esperança desse reencontro”, conta Liza.
Reencontro que, como bem
ressalta Alfredo, ele sabe que pode não acontecer. “Ela (a mãe) pode até já ter
morrido, passou-se muito tempo. Mas não tem importância: quero conhecer meus
tios, avós, primos, irmãos... a família que restou. Além disso, essa viagem já
valeu. Aqui todos são parecidos comigo... Pela primeira vez me sinto totalmente
à vontade, sinto que pertenço a algum lugar”.
Perseverança é ‘herança’ brasileira
Para a mãe de Alfredo,
Anna Kampen, 60, o “DNA brasileiro” foi determinante para que o filho tomasse a
decisão de cruzar o atlântico em busca de uma mãe que ele nunca conheceu. “Ele
sempre foi assim, briguento, de lutar pelo que quer. Os meus filhos brasileiros
sempre foram mais flexíveis que os holandeses”, disse, referindo-se a Alfredo e
Emanuel, 30, também brasileiro e adotado em Pernambuco, em 1985, e aos dois
filhos biológicos que tem com Johannes.
Na casa deles, inclusive,
adoção não é um tabu, garante Anna. “Não tem diferença entre eles, amo-os
igual”, garante, referindo-se aos filhos biológicos e adotados. Mas também não
é uma situação, assim, tão fácil de ser encarada, principalmente para o irmão
mais velho de Alfredo, o também brasileiro Emanuel, adotado em 1985, após ser
abandonado pela mãe na maternidade. “Para ele foi mais difícil, ele é muito
fechado, não conversa sobre isso. Mas sempre deixou bem claro que não quer
conhecer a mãe biológica”.
Fonte/Foto:
Mônica Prestes – A Critica/Arquivo Pessoal
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