DEPOIMENTO - A VIDA COMO ELA ERA: NO GARIMPO SEXO ERA TROCADO POR OURO
Danielle estava livre do
“Clube Dragon” e do namorado violento. Quando resolveu se prostituir em uma
boate num garimpo, ainda tinha medo. Tinha ouvido várias histórias. Era o final
do ano de 2004 e o risco de passar novamente por situação degradantes era
grande. No entanto, a esperança de conseguir dinheiro trocando sexo por gramas
de ouro era a sua única oportunidade para poder voltar para o Brasil.“Fui para
o garimpo com medo, mas pensei muito na minha família. Eu precisava de
dinheiro. Precisava conseguir muito dinheiro para voltar para o Brasil. Eu não
aguentava mais aquela vida”.
TRÊS GRAMAS
Danielle conheceu a mulher
que era a dona do cabaré no garimpo em um hotel. Conseguiu pagar a própria
passagem de avião. Encontrou um local completamente diferente. Foram travessias
de rios, caminhadas em matas, na lama, e caminhos tortuosos até chegar no “Bar
da Zenólia”. “Eu fiquei lá durante 15 dias. De lá, eu estava decidida a voltar.
O pagamento era só no ouro. Cada programa custava três gramas de ouro”,
detalha.
Durante o curto período em
que permanecia na segunda casa de prostituição, Danielle conheceu um
brasileiro, paraense, natural do município de Santarém. Decidida a voltar para
Belém, ela teve a ajuda do companheiro. “Ele me deu duzentos gramas de ouro,
mas ainda tive que voltar a Nickerie, para pegar os meus documentos, que ainda
estavam com meu ex”. Com a ajuda do novo companheiro paraense, ela conseguiu
voltar para a família. Alguns dos seus sonhos começaram a se realizar
gradativamente. Na primeira volta para o Brasil, em 2005, ficou um mês aqui.
Depois retornou ao Suriname, já mantendo o novo relacionamento. “Entre idas e
vindas, em 2008, eu voltei de vez. O nosso relacionamento começou a dar errado.
Eu estava longe da minha família, me sentia muito sozinha. Começaram as brigas.
Queria melhorar minha vida. Tinha cansado da mata, daquela rotina”.
Depois de tomar a decisão
de voltar definitivamente, durante o período em que viveu no Suriname ao lado
do brasileiro, no garimpo, Danielle conseguiu ajudar bastante a sua mãe.
Comprou a sua casa própria e reestruturou sua família consideravelmente.
Tragicamente, porém, há cerca de três anos, o ex-companheiro dela morreu
durante uma explosão dentro do garimpo.
NOVAS LUTAS
Hoje Danielle Lima
trabalha como recepcionista. Apesar de ter retornado em 2008 definitivamente ao
Brasil, admite que até hoje sofre com o preconceito das pessoas. Quando voltou
para casa, sentiu vergonha, Não contou à sua mãe de criação tudo o que havia
passado no Suriname. A lembrança da sua mãe de criação faz brotar lágrimas nos
olhos. Ela faleceu há dois anos. “Eu trouxe vários ursos de pelúcia de lá, mas
os joguei fora. Quando eu abraçava um urso lembrava muito da minha filha. Era
como se eu estivesse abraçada com a minha família. Sentia muita falta dos meus
filhos enquanto estava lá. Foi muito difícil ficar longe de tudo e da minha
mãe”. Para Danielle, compartilhar histórias com as outras mulheres, ligadas à
Sociedade de Defesa dos Direitos Sexuais na Amazônia (Sodireitos) foi
renovador.
A oportunidade veio após
um convite de uma colega que já participava do grupo e soube de sua história.
“Nunca contei para ninguém o que aconteceu comigo. Só quando descobri a
Sodireitos e conheci outras histórias de outras meninas. Mas mesmo assim nunca
contei todos os detalhes como estou contando para vocês”, sorri. Danielle
revela um fato duro da realidade do tráfico de mulheres. Só depois de
participar das palestras descobriu realmente que havia sido vítima de tráfico
humano. “Os aliciadores procuram justamente as mulheres frágeis, em
dificuldades, que têm família, filhos. É muito importante ter informação para
que ninguém mais passe por isso”.
Fonte/Foto: Fabrício
Nunes - Diário do Pará/Wagner Almeida
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