HIDRELÉTRICA MAIS CARA



- por Lúcio Flávio Pinto* 

O início do funcionamento da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, projetada para ser uma das maiores do mundo, está atrasado um ano. A primeira das 20 turbinas devia começar a gerar em fevereiro de 2015 – dentro de dois meses, portanto.
No novo cronograma, isso só deverá acontecer no primeiro trimestre de 2016. O concessionário e a Aneel, a agência federal de energia elétrica discutem sobre a responsabilidade desse atraso. Se for sua, a Norte Energia terá que comprar de terceiros a energia que será obrigada a fornecer aos consumidores com os quais assumiu compromisso.
A conta é de 370 milhões de reais ao mês. Se for confirmado o atraso de um ano, o encargo adicional somará quase R$ 4,5 bilhões, o equivalente a 15% do custo total da usina, a preços de hoje. É um gasto extra impossível de ser absorvido pelo concessionário se não puder repassar ao valor da tarifa e não dispuser de capital novo para arcar com o prejuízo até poder ser ressarcido. É esse o maior desafio imediato da obra.
Quem leu a manchete de O Liberal de hoje sobre o assunto e a matéria distribuída pela agência de notícias de O Estado de S. Paulo, usada pelo jornal paraense, deve ter pensado que se trata de mais um penduricalho (e coloca penduricalho nisso) do escândalo da Petrobrás.
O acréscimo feito ao orçamento da hidrelétrica é tratado como “rombo”. Em sendo um rombo em mais um paquiderme em andamento do PAC (o maior de todos, aliás), a referência é logo associada a desvio de dinheiro púbico, roubo, propina, maracutaia.
Não é isso. O ônus de R$ 370 milhões ao mês surgiu porque a usina não ficou pronta na data estabelecida no contrato de concessão, assinado em 2010, para começar a fornecer energia ao Sistema Integrado Nacional, com seus compradores certos. O concessionário atribui o atraso a fatores externos, que vão desde as manifestações de protesto até demoras nas liberações pelos órgãos públicos.
Sem essas interferências vindas de fora do canteiro, as obras teriam evoluído no tempo previsto e Belo Monte não só cumpriria seus compromissos como poderia começar a gerar com lucro, segundo a Norte Energia. Seus argumentos, entretanto, não foram aceitos pela Aneel, que se dispôs a impor à empresa as despesas pelo uso de energia de terceiros. Mas o contencioso ainda está sujeito a discussões ou revisão.
Se for mantido o entendimento do órgão governamental, como essa nova conta será paga, se puder ser paga (o que parece impossível no orçamento da hidrelétrica)? Pelos acionistas da Norte Energia. Seus controladores são empresas estatais de energia, à frente a combalida Eletrobrás, e fundos federais de pensão. Ou seja, o governo. Em última instância, o contribuinte,
Sem capital próprio, o consórcio poderá recorrer a empréstimo. O BNDES manteria sua disposição de financiar 80% de tudo que Belo Monte gastar, como vem fazendo com o cronograma financeiro regular do empreendimento?
Parar a obra, no estágio avançado em que ela está, parece fora de cogitação. Por isso, uma coisa é certa: a hidrelétrica do rio Xingu passará logo do limite de R$ 30 bilhões.

- *Lúcio Flávio Pinto - Jornalista profissional desde 1966. Percorreu as redações de algumas das principais publicações da imprensa brasileira. Durante 18 anos foi repórter em O Estado de S. Paulo. Em 1988 deixou a grande imprensa. Dedicou-se ao Jornal Pessoal, newsletter quinzenal que escreve sozinho desde 1987, baseada em Belém
No jornalismo, recebeu quatro prêmios Esso e dois Fenaj, da Federação Nacional dos Jornalistas. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace e, em 2005, o prêmio anual do CPJ (Comittee for Jornalists Protection), de Nova York.

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