O QUE SERÁ DO PARÁ EM 20 ANOS?
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Porto graneleiro da Cargill em Santarém. |
por Edilberto Sena (*)
A pergunta pode ser também
sobre o futuro próximo da Amazônia. Esta perde hoje cerca de 5.000 km2 de
floresta por ano, que somando as derrubadas dos últimos 12 anos, já chega a
cerca de 120.000 km2 de mata no chão, segundo os pesquisadores do INPA. Isto
equivale a 16% de desflorestamento da Amazônia.
Mas concentrando a
reflexão sobre o Estado do Pará, Santarém incluída. O que pensar sobre o futuro
próximo? O governo federal, ansioso por crescer a economia do país, se contenta
em estimular o extrativismo predador. Facilita as concessões para extração de
minérios e madeira e exportação de carne de gado, além do grande incentivo à
produção de soja e milho.
A presidente Dilma
anunciou recentemente a liberação de 135 milhões de reais para o plano safra
2014/2015, isto é, para o agronegócio. Com tais facilidades, os ruralistas
avançam sobre a floresta e já pressionam por liberação de terras indígenas para
mineração e produção agrícola.
Com tal generosidade para
mineradoras e agronegócio, as grandes empresas se sentem à vontade para
expandir seus negócios. Um exemplo está no Pará, rico em minérios (ferro,
manganês, bauxita, ouro, fosfato, nióbio ente outros), é campo fértil para
empresas estrangeiras e do sul do país.
O extrativismo predador
faz o Pará perder recursos, de um lado pela lei Kandir, que deixa de receber
imposto de exportação; de outro lado, suas riquezas saem para o mercado
internacional e ficam os buracos e poluição ambiental. Em consequência, a
sociedade continua com baixo índice de desenvolvimento humano (o Pará é hoje o
16º estado brasileiro em IDH).
Não há interesse dos
governos, nem federal, nem estadual, nem municipais, de exigir melhoria de
qualidade de vida para os 8 milhões de habitantes paraenses.
Navios e balsas passam
carregados de riquezas pelos rios da região, mas os municípios usufruem nada
dos saldos financeiros. Com um agravante, pois grande parte das riquezas
exportadas não são renováveis, como é o caso da bauxita extraída do rio
Trombetas e de Juruti como também o ouro extraído do rio Tapajós.
Falta quem defenda a
dignidade das populações empobrecidas do Pará. Quando há uma reação de revolta,
como em recente movimento na cidade de Juruti, não por causa da extorsão da
multinacional que sai quase diariamente com navio carregado com toneladas de
bauxita, mas sobre o incompetente prefeito municipal [Marquinho Dolzane], que
por seu turno, não defende os interesses de seu povo. Em vez disso, manda a
polícia enfrentar os revoltados cidadãos.
Em Santarém não é
diferente.
Dois novos portos
graneleiros estão previstos para serem construídos e já o poder público
municipal providencia nova rota de entrada de carretas com soja. Será uma
avenida pavimentada. Moradores do bairro Pérola do Maicá, preocupados com as
novidades do progresso, sentem-se ameaçados de terem que sair de suas casas que
conquistaram com tanto sacrifício.
Não tendo documento de
propriedade, temem serem enganados pelas empresas. Isso inclui a preocupação
com a presença de dois portos graneleiros, concentrando motoristas de carretas
e riscos de prostituição no bairro. Então se perguntam: por que dois portos
dentro da área urbana e não lá para o perímetro das barreiras? O prefeito fala
em nova avenida e rodovia, mas não pergunta se os moradores concordam.
Também uma fábrica de
cimento está sendo negociada pelo prefeito santareno, para ser instalada na
periferia da cidade. Há certamente quem se alegre com o anúncio da construção
de um galpão depósito para os produtos da zona industrial de Manaus em
Santarém. Tudo isso, anunciado certamente não será para melhorar a qualidade de
vida da população. Pelo contrário, esta terá mais problemas, com poucas ofertas
de emprego, sofrimento com trânsito etc.
Aqui entra um caso
exemplar de servidão voluntária e humilhante de autoridades e população ao
poder do capital. Trata-se da ampliação do porto da multinacional Cargill em
frente de Santarém.
Hoje, a empresa exporta 2
milhões de toneladas de soja e milho por ano e deixa cerca de R$ 8.000,00 por
mês no cofre municipal, apenas pelo ISS que paga. Essa informação veio de
dentro da prefeitura, garantindo que só entra imposto ISS.
Agora sua porta-voz
anunciou aos vereadores na Câmara que vai ampliar o porto, dentro de 15 meses
para exportar 5 milhões de toneladas de soja por ano. Tudo isso ao preço de
mais prejuízos à população da cidade. O que foi área de lazer para bairros de
periferia por 25 anos, o campo da Vera Paz, será mais um armazém.
Para quem já esqueceu, uns
dois anos atrás, a direção das Docas do Pará expulsou os usuários do campo da
Vera Paz, alegando que seria para pesquisa arqueológica. Uma mentira deslavada
que hoje serve para a Cargill construir mais armazém em cima de mais um sítio
arqueológico.
Empresários locais
aplaudem esse progresso, os vereadores se calaram em sua maioria quando foi
anunciada a ampliação do porto, deputados da região e governo do Estado
aplaudem também o avanço do capital em Santarém. Todos são cúmplices
interesseiros, ou indiferentes aos impactos negativos desses empreendimentos
desenvolvimentistas.
Se a Cargill vai exportar
5 milhões de toneladas de soja por ano, dentro de mais 15 meses, quantas
carretas serão necessárias descendo a serra do Piquiatuba, pela única via até o
porto graneleiro?
Falam já em 450 carretas
transitando pela BR-163, que passa por quatro bairros da cidade até chegar ao
porto. No trecho não há acostamento, nem calçada para pedestre. Quantos
acidentes e mortes advirão aos seres humanos que vivem no perímetro?
O prefeito, em discurso
humilhante no bairro, diz aos moradores que não pode fazer nada porque a
rodovia é federal, mesmo correndo dentro da área urbana.
Uma pergunta final: por
que uma empresa multinacional que usufrui milhões de reais com a exportação de
grãos pelo porto de Santarém não constrói uma fábrica de esmagamento de soja em
Santarém?
Seria uma forma de
partilhar benefícios com a população que cede espaço para seu porto. Haveria
mais empregos diretos e indiretos, haveria produção de derivados de soja que
hoje Santarém importa do sul e haveria mais impostos entrando no município e
Estado.
Alguém respondeu que isso
não seria interessante para a Cargill, porque o mercado regional é pequeno
demais para absorver os produtos. Isto é, se não gera mais lucro a empresa não
tem compromisso com a região.
Tudo isso acontecendo na
Amazônia, no Pará e em Santarém. Uns aplaudindo, outros indiferentes e a
maioria ficando à margem desse progresso. Daí a questão: o que será de
Santarém, do Pará e da Amazônia daqui a 5 anos, 10 anos e 20 anos? Alguém tem
dúvida?
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* Santareno, Edilberto Sena (foto) é padre diocesano. É coordenador da
Comissão Justiça e Paz da Diocese de Santarém. Escreve regularmente no blog
www.jesocarneiro.com.br.
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