COISAS DA REGIÃO: "O QUE HOUVE, COMEU ABIU?"

*Massilon de Medeiros Cursino

Após a comilança de abiu, o querosene da lamparina era a receita para passar nos lábios grudentos, decorrente do látex leitoso que coagulava em contato com o ar. Como a manteiga era coisa de bacana, apelava-se para a sobra do recipiente que iluminava as trevas, a velha lamparina.
O fruto amarelado como um símbolo da pátria contrasta com o verde das folhagens do abieiro e o sabor adocicado compensava e ainda compensa a aderência labial passageira.
Por conta de tal aderência, o termo “comeu abiu” pouco a pouco está sendo incorporado ao vocabulário como sinônimo de quem por um motivo ou outro mudou de comportamento de falante para silente, quase mudo.
Em política é muito comum encontrarmos os comedores de abiu, da mesma forma que em sua órbita estão acomodados os que apreciam o fruto e depois não conseguem mais ser nem o polêmico nem o falante de antes. Já não se vê na mídia com o mesmo entusiasmo a imagem do “sabe tudo”, da pessoa que tem a fórmula correta ou a panacéia para todos os males sociais e políticos, nem mesmo quando impelidos.
Hoje a manteiga está mais acessível à mesa de todas as classes sociais. Dizem que graças a Deus e às políticas assistencialistas de governos inclinados a atender aos anseios da massa, como corolário, os números indicam que ocorreu uma considerável mobilidade social nos últimos anos: Nos últimos 10 anos, 32 milhões de pessoas ascenderam à categoria de classes médias (A, B e C) e 19,3 milhões saíram da linha pobreza no Brasil.
Se nem assim os comedores de abiu conseguem passar manteiga nos lábios para destravar a boca, a velha receita do querosene ainda pode ser de grande valia.


* O autor é Economista, Bacharel em Direito e Chefe da Agência da Sefaz em Parintins.

Colaborador JI

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