COMO FUNCIONA A ROTA DO TRÁFICO DE PESSOAS NA AMAZÔNIA
CNBB expõe horrores do tráfico humano com campanha que
traz à tona a situação de pessoas que vivem nessa condição
A Amazônia é um dos focos
de atenção da Campanha da Fraternidade (CF) deste ano. O tema – “Fraternidade e
Tráfico Humano” – traz à tona a grave situação em que vivem aproximadamente 800
mil pessoas de diferentes regiões do mundo na condição de traficadas. Parte
desse universo é do Brasil e, a maioria, mulheres adolescentes e jovens, na
faixa etária de 14 a 21 anos. Os dados são da Organização Internacional do Trabalho
(OIT, ano de 2012) e de pesquisas nacionais e internacionais nessa área.
Detentora de 11 mil
quilômetros de fronteira dos quais o Amazonas responde por uma faixa de 6,5 mil
quilômetros, a Região Amazônica tornou-se um dos corredores internacionais do tráfico
de pessoas. Chamar a atenção para esse crime ainda submetido ao silenciamento é
um dos objetivos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), vinculada
à Igreja Católica, e responsável pela realização anual da CF. Em Manaus, o
lançamento da campanha será às 9h, da quarta-feira de cinzas (dia 5), na Igreja
Matriz, Centro, em ato celebrado pelo arcebispo dom Sérgio Eduardo
Castriani. Até lá, em várias paróquias e
entidades, estão sendo realizadas formações para religiosos e leigos convocados
a atuar na mobilização comunitária.
A CNBB, ao eleger o
assunto como tema da CF-2014, compromete-se também em colocar a estrutura que
movimenta em prol de estudos e formulação de propostas para o Brasil avançar
nacionalmente nas ações de enfrentamento ao tráfico de pessoas e da exploração
sexual de crianças, adolescentes e jovens. O lema da campanha deste ano diz: “É
para a liberdade que Cristo nos libertou”.
Pesquisa feita pela
socióloga Márcia Maria de Oliveira, doutoranda do Programa de Pós–Graduação
Sociedade e Cultura na Amazônia (PPGSCA-Ufam), identificou 92 jovens da
Amazônia como prestadoras de serviços sexuais em Portugal, Espanha e Itália. De
acordo com Márcia Oliveira, 33 delas aceitaram participar do estudo que é parte
da tese de doutorado da socióloga, e todas vivem uma intensa rotina de
obrigações que envolve, durante o dia, limpeza das casas onde, à noite, elas
devem conquistar clientes, seguindo um ritual que envolve dança, consumo de
bebidas alcoólicas e, com muita freqüência drogas. Nessa relação, a maioria
delas é devedora da casa e/ou agência que as contratou numa conta que
dificilmente pode ser quitada.
Um dos dados da pesquisa
de Márcia Oliveira mostra que o interesse pelo recrutamento de mulheres dos
Estados Amazônicos nos países europeus é porque as jovens integram o grupo de
“mão de obra” de preço mais baixo. “As mulheres da Amazônia na Europa estão na
última faixa da tabela de preços”, afirma a pesquisadora.
Adotar ‘filhos de criação’
Dispostos a lutar por
ações concretas no Estado do Amazonas, mobilizadores da Campanha da
Fraternidade deste ano querem ver efetivadas medidas de prevenção ao tráfico, à
exploração sexual e à pedofilia. Para Márcio Oliveira e a freira Santina Perin,
da Rede Um Grito Pela Vida, da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB
nacional), a batalha tem que ser travada em duas frentes: uma que se realiza
nos estudos sobre o tema, nas denúncias a respeito das terríveis condições em
que vivem as jovens agenciadas e submetidas a trabalhos sexuais em outros
países e no Brasil; outra, é o lançamento de uma campanha envolvendo o
Ministério Público para que sejam legalmente adotados os “filhos de criação”.
“Essa, afirma Márcia
Oliveira, é uma das práticas comuns na Amazônia. Crianças são levadas para as
capitais, com o aceite dos pais, pelos ‘padrinhos’ e são submetidas a longas
jornadas de trabalho e abusadas sexualmente. Precisamos dar um basta nisso!”. A
pesquisadora vê na adoção oficial uma saída a esse tipo de crime.
Mobilizar para mudanças
Estamos diante de um
fenômeno abominável ainda assim submetido a um dos maiores silêncios da
humanidade”, afirma a Irmã Santina Perin, 72, da Congregação Imaculado Coração
de Maria (ICM-Manaus) e da Rede Um Grito Pela Vida, da Conferência dos
Religiosos do Brasil (CRB nacional). A ICM nasceu há pouco mais de um ano para
combater e prevenir o tráfico de seres humanos na Região Norte do Brasil. Irmã
Santina é uma das mobilizadoras da causa e uma figura marcada pela determinação.
No dia 15, numa das
formações para a Campanha da Fraternidade deste ano, a religiosa conversou com
um grupo de 40 pessoas, no auditório da rádio Rio Mar, Centro, e pediu: “soltem
o verbo comunicadores!”. E completou: “o povo precisa de saúde, de educação, de
respeito a sua condição humana. Vocês, comunicadores, tenham coragem, pois
liberdade não se compra; dignidade não se vende”. Para a freira, é fundamental que os aparatos
de comunicação hoje existentes sejam
utilizados como parte do processo de conscientização da sociedade.
Fonte/Foto:
Ivânia Vieira – acrítica.uol.com.br/Reprodução
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