MUIRAQUITÃ
A Lenda do Muiraquitã
(amuleto confeccionado em jadeíte, nefrite, ordósia, diorite, estratite ou
pedra-cristal), mais de que qualquer outra da região amazônica, se destaca pelo
fascínio, pelo mistério e pela controvérsia que envolvem o mineral do qual é comumente
feito (jade) e a versão principal de sua origem (da legendária tribo das
Amazonas), evocando questionamentos entre arqueólogos, historiadores e
colecionadores. O artefato possui formas variadas: cilíndricas, antropomórficas
e zoomórficas, sendo os mais afamados os de cor verde (jade) e de forma
batraquiana (sapo). Mas o Muiraquitã também pode ser encontrado em cores de
azeitona, leitosa ou escura, dependendo do material empregado em sua confecção,
todos com atributos mágicos e terapêuticos, atraindo sorte a seus detentores e
curando doenças pelo uso do talismã.
A fama e o exotismo do
amuleto o tornaram cobiçado desde os primórdios da colonização da Amazônia, nos
séculos XVII e XVIII, quando foram encontrados pela primeira vez nas
proximidades dos rios Nhamundá e Tapajós.
Poucos são os exemplares
que podem ser apreciados atualmente, principalmente em sua região originária.
Eles estão espalhados pelos principais museus do mundo e em coleções
particulares, mas o Museu de Santarém exibe mostra do raro artefato, além de
réplicas feitas em cerâmica e outros materiais. A cidade também cuidou de
cultivar o talismã na bela arte joalheira ali desenvolvida pelo artesão João
Sena, cujo modelo original foi confeccionado pelo artista plástico local
Laurimar Leal.
A Lenda
Segundo a lenda mais
comum, os verdadeiros Muiraquitãs são filhos da Lua, retirados do fundo de um
imaginário lago denominado Espelho da Lua, Iaci-uaruá, na proximidade das
nascentes do rio Nhamundá, perto do qual habitavam as índias Icamiabas, nação
das legendárias mulheres guerreiras que os europeus chamaram de Amazonas
(mulheres sem marido). O lago era consagrado à Lua, pelas Icamiabas, onde
anualmente realizavam a Festa de Iaci, divindade mãe do Muiraquitã, que lhe
oferecia o precioso amuleto retirado do leito lacustre. A festa durava vários
dias, durante os quais as mulheres recebiam índios da aldeia dos Guacaris,
tribo mais próxima das Icamiabas, com os quais mantinham relações sexuais e
procriavam. A lenda também diz que, se dessa união nascessem filhos masculinos,
estes seriam sacrificados, deixando sobreviver somente os de sexo feminino.
Depois do acasalamento, pouco antes da meia-noite, com as águas serenas e a Lua
refletida no lago, as índias nele mergulhavam até o fundo para receber de Iaci
os preciosos talismãs, com a configuração que desejavam, recebendo-os ainda
moles, petrificando-se em contato com o ar, logo após saírem d’água. Então os
presenteavam aos Guacaris com os quais se acasalavam, o que os faria serem bem
recebidos onde os exibissem, além de dotar outros poderes mágicos ao amuleto.
Controvérsia
Barbosa Rodrigues
(Muirakitã, Estudo da Origem Asiática da Civilização Amazônica – 1889) defende
que o amuleto é a mais evidente prova da origem asiática das antigas
civilizações amazônicas, pois acreditava que até então, na Região, como no
restante do continente americano, não havia ocorrência de jazidas de jade, ou
que ele aqui tenha sido trabalhado, o que faz acreditar que os artefatos do
mineral pertencem à mesma civilização e origem. Esta teoria apaixonou
pesquisadores brasileiros, havendo muita discussão sobre o assunto, em virtude
dos Muiraquitãs aparecerem em locais em que se desconhecem jazidas do mineral
(jadeíte) no continente americano.
Relatos de Gabriel Soares
de Sousa (1558) e Frei Ivo d’Evreux (1613) contradizem a afirmação de Barbosa Rodrigues
e revelam a existência de “pedras verdes” nos sertões brasileiros, tese
confirmada mais tarde por Simoens da Silva, em sua obra Nephrite in Brazil,
apresentando ocorrências do mineral em Amargosa (BA) e peças encontradas em
Campinas (SP), Piuí (MG), Pinheiros (RJ), Óbidos (PA) e Olinda (PE). Outros
pesquisadores também jogam por terra a origem asiática da civilização
amazônica, inclusive a arqueóloga Ana Roosevelt, que afirma, em recente
descoberta, ser Monte Alegre (PA) o berço do homem americano.
As traduções do nome
variam (mira-ki-tá, botão ou nó de gente, muira-kitá, nó de pau), assim como a
própria lenda do Muiraquitã pode ser contada de outras maneiras. Esta que
acabamos de ler é uma das versões. Neste contexto, outras controvérsias pairam
sobre a origem do artefato pré-colombiano, quer em formato de peixe, sapo e
tartaruga, geralmente arredondado, que até hoje fascina o imaginário popular.
Sua história romântica se propaga através dos tempos, fascinando ouvintes,
leitores e até mesmo os que não acreditam em lendas, que podem sentir o poder
mágico do talismã em estudos arqueológicos mais ortodoxos e nas peças expostas
em museus.
Fonte/Fotos/Imagens: amazonialendas.blogspot.com
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