PARÁ: HOSPITAL INVESTIGA DIVULGAÇÃO DE IMAGENS DE PACIENTE INTERNADO
Segundo bombeiros, pessoas saírem com vida no acidente aéreo em Belém foi milagre. |
Fotos mostram rosto desfigurado de vítima de acidente
aéreo.
Homem seria o piloto do avião que se acidentou na
última sexta, 26.
O Hospital Metropolitano
de Urgência e Emergência em Ananindeua (HMUE), na Região Metropolitana de
Belém, está investigando se fotos de um paciente que foram veiculadas em redes
sociais e aplicativos de compartilhamento de imagens em telefones celulares da
capital foram tiradas dentro do hospital. As imagens, que seriam do piloto
Paulo Vicente Cancela, internado após acidente envolvendo um monomotor em Belém
no dia 26, são chocantes e mostram o rosto do paciente antes e depois da
cirurgia.
Há ainda outra foto, que
mostra o piloto na sala de cirurgia, despido e ensanguentado. Ao lado do
paciente, há pelo menos três pessoas vestidas com uniformes onde é possível ler
“Bloco Cirúrgico”. Uma delas segura um celular na direção do rosto do piloto.
Segundo o hospital, não é
possível afirmar que as fotos tenham partido de dentro da unidade médica,
embora o paciente permaneça internado em estado gravíssimo desde o dia do
acidente, impossibilitando que imagens do pós-operatório tenham sido feitas em
qualquer outro lugar. Até o momento, nenhum funcionário foi identificado como
sendo autor das imagens.
Internet
Segundo a diretora da
Divisão de Prevenção e Repressão a Crimes Tecnológicos (DRCT), Beatriz
Silveira, veicular este tipo de imagem pode ser considerado crime. “Esse tipo
de veiculação pode atingir tanto a honra do paciente quanto de seus familiares,
uma vez que se trata de divulgação de imagem sem autorização. Assim, pode
caracterizar os crimes de injúria e difamação, previstos no Código Penal
Brasileiro”, esclarece.
De acordo com Silveira,
este tipo de atitude pode até mesmo gerar um processo indenizatório, caso a
família da vítima decida acionar os responsáveis na justiça. E isto vale tanto
para quem tirou as fotos quanto para o hospital, que seria a instituição
responsável pelo paciente. “É válido ressaltar que esse tipo de conduta pode
gerar a obrigação de indenizar, em razão de danos morais sofridos por quem teve
sua imagem divulgada indevidamente”, afirma.
No caso das redes sociais,
a delegada explica ainda que é possível identificar a origem das publicações.
“Na maioria dos casos é possível identificar de onde partiram as postagens, em
sites e redes sociais”, assegura. Além disso, compartilhar as fotos também pode
ser caracterizado como crime. “Mas para isso, a família da vítima teria que se
manifestar contra a pessoa que compartilhou ou divulgou a foto”, diz.
Violação
Se a foto tiver sido feita
dentro das dependências do Hospital Metropolitano, a atitude poder ser qualificada
como violação de sigilo profissional, além de crime contra a honra do paciente.
É o que explica a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB/PA), Luanna Tomaz: “Dependendo de quem tirou a foto,
pode ser violação de sigilo profissional, crime contra a honra, utilizar a
imagem de forma devida, dentre outros. Claramente quem tirou a foto, se foi
algum profissional do hospital ou policial, violou o código de ética
profissional, e pode até ser exonerado, suspenso ou advertido”, completa.
Para ela, a principal
medida a ser tomada nestes casos é abrir um diálogo entre os profissionais e a
administração do hospital. “Acima de tudo, vale a questão do hospital ter um
diálogo com os profissionais, informando
que não pode acontecer esse tipo de coisa, expor o ser humano a uma situação
assim. Isso é absurdo e cada vez mais comum. Recentemente vimos em vídeos
pessoas que agridem ladrões. Crianças vão ter acesso, várias pessoas vão ter
acesso, e isso estimula a violência, o desrespeito às pessoas, ao piloto e à
própria família dele. Viola o direito da pessoa de preservar a sua imagem no
momento vulnerável”, ressalta.
A advogada esclarece que,
em casos como este, os responsáveis pela divulgação inapropriada podem ser
acionados legalmente. “A ação judicial vale para quem tirou e quem divulgou, no
caso, as pessoas que compartilharam esse tipo de foto [nas redes sociais]. A
família pode mover uma ação cível contra a pessoa [que tirou a foto] pela forma
que ele [o piloto] foi exposto, mas depende de como a foto foi obtida. Se foi
dentro do hospital, existe uma questão ética. Dentro do hospital, a preservação
do paciente é o principal, e cabe sim até mesmo uma indenização”, garante.
Trauma familiar
Para a psicóloga Ivani
Vidal de Oliveira, a família do paciente provavelmente precisará de uma
“atenção profissional” para lidar com a exposição de um momento como este. “A
família provavelmente vai precisar de uma atenção psicológica, porque a vida de
alguém que eles amam está jogada numa rede social como se fosse uma imagem
qualquer. Imagens de tragédias não são banais. Quando divulgam este tipo de
coisa, ninguém mede as consequências
para a família. E ver um parente nessa situação é muito traumático”, explica.
Segundo ela, ainda que
seja apenas uma foto, a exposição da tragédia é tão prejudicial como um dano
físico.
“A gente se assusta com
casos brutais de violência, mas acaba com a vida de uma família no momento em
que participa de um ciclo como este, de compartilhar imagens de uma tragédia
pessoal. Isso é perversidade da imagem, e é tão brutal quanto um dano físico”,
assegura.
De acordo com a psicóloga,
a insensibilidade é uma característica dominante neste caso, já que há uma
divulgação indiscriminada da imagem de uma pessoa que não tem relação direta
com os usuários das redes sociais. “A grande questão é que atualmente, parece
que a normalidade virou patologia. Todo mundo compartilha tudo com todo mundo,
e aí caímos na questão da insensibilidade”, comenta.
“É como se comemorassem
apenas as tragédias: todo mundo para no trânsito para olhar um acidente, uma
pessoa ferida ou até mesmo morta. Parece uma atitude tão automática, que é como
se você precisasse do sofrimento e da tragédia alheia para ver que o ‘outro é
pior que eu, que não sofro sozinho’. As pessoas estão mais ligadas ao
noticiário ruim do que às coisas boas. Quando você tem uma notícia ou alguma
coisa boa, você esconde. Por medo, por inveja, por diversos fatores que te
fazem não querem compartilhar aquela alegria. Então hoje, ninguém mais divide o
que é bom”, finaliza.
Fonte/Foto:
Ingrid Bico –G1/Thais Rezende
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