ARTIGO DEDOMINGO: A MORTE DO JORNALISMO
- por Lúcio Flávio Pinto (*)
O
jornalismo acabou na grande imprensa do Pará.
O
Repórter 70, na edição de hoje de O Liberal, dedica quase metade do seu espaço,
em seis notas sucessivas, para responder ao editorial de ontem do Diário do
Pará. Em apenas uma das notas há alguma preocupação com os fatos e o leitor.
Todo resto é uma algaravia de ataques e ofensas aos Barbalhos.
A
atual celeuma se originou numa nota da principal coluna do jornal dos
Maioranas. Ela dizia que o gerente comercial do Diário procurara o prefeito
Zenaldo Coutinho, ou algum dos seus assessores. Cobrou que a prefeitura
reservasse, para aplicar em publicidade no jornal, 10% da verba, de 27 milhões
de reais, liberada pelo ministro Helder Barbalho, da Integração Nacional, junto
com o pai, o senador Jader Barbalho, ambos do PMDB.
O
dinheiro foi destinado à recuperação da proteção à orla das praias de
Mosqueiro. A prefeitura o aplicará sem precisar fazer contrapartida. Dinheiro
sem volta, a fundo perdido.
O
Diário reagiu, ontem, dizendo que a história era mentirosa. Anunciou que iria
imediatamente processar O Liberal na justiça com ações cíveis e criminais.
Ao
invés de apontar fatos e ouvir fontes identificáveis, a partir do próprio
prefeito, O Liberal se defende apenas atacando o concorrente e seus donos, que
recriaram em Belém uma réplica feroz, grosseira e rústica da rivalidade de
Montecchio e Capuletto, imortalizada por Shakespeare em Romeu e Julieta. A
versão paraense é ultrajante.
Na
única das seis notas aproveitáveis, diz o Repórter 70:
“Esta
coluna, que revelou a informação, acredita em sua veracidade, porque veraz é a
fonte que a transmitiu. Daí ser resível, ridículo e despropositado ver o
papelucho de mentiras diárias dos Barbalhos dizer que a informação é falsa. Que
moral têm eles para negar as barbalhices que propagam, já que são ícones da
corrupção? Está aí Jader Barbalho, esse provecto espertalhão, cada vez mais
esperto e metido em todos os esquemas de corrupção, como Banpará, Sudam e agora
Lava Jato, na qual está sendo investigado”.
O
jornal pode atacar como quiser seus inimigos, respondendo pelo que dizem deles.
Mas ao tratar de matéria de interesse público, seu primeiro compromisso é com a
veracidade dos fatos. Se o Pará ainda estivesse afeito ao significado dos
fatos, o jornal deveria ter ouvido o prefeito. Zenaldo podia confirmar a
história, desmenti-la ou se omitir. Mas teria que ser procurado e teria que ser
obrigado a fazer qualquer declaração.
Se
não quisessem dar aos seus inimigos mortais o direito de resposta, ouvindo o
personagem citado, o gerente comercial Nilton Lobato, os Maioranas também poderiam
procurar os tais assessores para um off detalhado: o dia do encontro, sua
duração, o teor da conversa e, talvez, até, uma gravação clandestina.
Afinal,
em plena época de caça aos corruptos e de defesa dos cofres públicos, um
ministro do governo federal estaria
dando oportunidade à prática de extorsão a partir de recursos do erário, em
proveito de uma empresa da qual é sócio. Se verdadeira a nota de O Liberal,
Helder Barbalho teria que pedir demissão ou ser demitido do cargo que ocupa.
Até
agora, nada indica que a informação tenha procedência. A não ser que o prefeito
Zenaldo Coutinho seja a fonte secreta de O Liberal, usando o jornal para
“plantar” a informação. Se for assim, o prefeito tem que ser chamado à ordem
para esclarecer esse fato, que, se verdadeiro, é muito grave.
Como
O Liberal preferiu lançar flechas envenenadas na direção dos inimigos, ao invés
de esclarecer a opinião pública, incorpora a carapuça de sempre, que partilha
com o Diário: de mentir descaradamente para a população e se lixar para o
jornalismo. Não há limites para esse ultraje.
Falta
apenas mandar rezar o réquiem para que a alma penada dos dois principais grupos
de comunicação do Pará tenham uma boa morte. Ao proceder de forma tão leviana e
arrogante, eles se suicidam como instituições que mereçam respeito e
credibilidade.
(*) Lúcio Flávio Pinto é jornalista profissional desde
1966. Percorreu as redações de algumas das principais publicações da imprensa
brasileira. Durante 18 anos foi repórter em O Estado de S. Paulo. Em 1988
deixou a grande imprensa. Dedicou-se ao Jornal Pessoal, newsletter quinzenal
que escreve sozinho desde 1987, baseada em Belém.
No
jornalismo, recebeu quatro prêmios Esso e dois Fenaj, da Federação Nacional dos
Jornalistas. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças
sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace e, em
2005, o prêmio anual do CPJ (Comittee for Jornalists Protection), de Nova York.
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