A Copa de 82, na Espanha, me oferece lembranças muito vivas. O
esquadrão comandado por Telê Santana era um primor de técnica e plasticidade.
Só fazia golaço. Waldir Peres, Leandro, Oscar, Luisinho e Junior, Falcão,
Cerezo, Zico e Sócrates, Serginho e Éder. Parte da imprensa pegava no pé do
treinador brasilero por não jogar com dois pontas abertos. Bobagem. Tempos
depois, provou-se absolutamente desnecessário, quase nenhum time voltou a
adotar esse esquema. Os dois melhores centroavantes em atividade se machucaram
(Reinaldo e Careca) e o Dinamite foi deixado no banco. Um erro, na humilde
opinião desse escriba vascaíno. Ele faria mais que o Serginho.
Depois de passar sufoco ao vencer a URSS por 2×1, de virada, a
seleção brasileira não teve problemas para derrotar a Escócia (4×1), Nova
Zelândia (4×0) e Argentina (3×1). A fatídica tragédia do Sarriá, quando fomos
dolorosamente superados pela Itália por 3×2, foi por muito tempo minha maior
decepção futebolística, pela qual chorei muito, como quase todo guri de 9 anos
naquele dia. Houve um pênalti não marcado do lateral italiano Gentile em cima
de Zico, que poderia dar outro desfecho à partida. O doutor Sócrates também
perdeu um gol de cabeça a três metros da linha, poucos minutos antes do fim do
jogo.
O Brasil, com vantagem do empate, havia igualado o marcador duas
vezes, mas não conseguiu o terceiro, após entregada inacreditável de Toninho
Cerezo na intermediária. As ruas coloridas de verde amarelo por todo país
ficaram vazias e os 123 milhões de brasileiros, em silêncio. Aquela emblemática
derrota foi um ponto de inflexão para o nosso futebol, que desde então passou a
gerar mais e mais teóricos do ‘defenda-se antes de atacar’.
Na sequência da Copa, a surpreendente Itália de Paolo Rossi,
artilheiro do torneio com seis gols, três deles no Brasil, se consagraria
tricampeã. A Azurra passou da primeira fase com as calças na mão, pelo saldo de
gols, após três empates. Depois, liquidou Argentina, Brasil, Polônia e
Alemanha. Cresceu na hora certa. Ninguém pode dizer que foi injusto.
Provavelmente tenha sido uma das melhores Copas da história. A vice campeã
Alemanha, de Rumeniggie, a França de Platini e a Polônia de Boniek eram times
memoráveis.
Em 1979, já havia lamentado o vice campeonato brasileiro do Vasco,
batido pelo Internacional RS, que de fato tinha um time muito superior. Mal
sabia eu que decepções futebolísticas seriam comuns na sequência da
minha vida a partir dali, interrompidas por efêmeros períodos de
satisfação.
Após a eliminação, à noite no Jornal Nacional, Fernando Vanucci
noticiou a derrota com a voz embargada, quase chorando. Era a cara do Brasil
naquele 5/7/82, ano em que se materializaria de forma irreversível a abertura
política, com eleição para governador em todos os estados. Uma safra que trouxe
Franco Montoro, Tancredo Neves e Leonel Brizola aos governos de SP, MG e RJ. No
Paraná, José Richa, por quem eu torcia, se elegeria. Eu não gostava da ditadura
e por isso nutria antipatia por todos os candidatos do PDS. Na quarta série do
ensino fundamental já estava ligado ao noticiário político. O voto à época era
vinculado, e o PDS elegeu 12 governadores, contra 9 do PMDB e 1 do PDT. A
economia ia de mal a pior, com recessão e inflação galopante. Os maus
presságios de 1978 se concretizaram (vide artigo anterior).
No mundo, a Inglaterra derrotava a Argentina na guerra das
Malvinas, com pouco mais de 600 baixas argentinas e 200 britânicas. O desfecho
foi a pá de cal no regime ditatorial do nosso vizinho, que elegeria
democraticamente Raul Alfonsin no ano seguinte. Também fortaleceu a primeira
ministra Margaret Thatcher, que permaneceu no comendo do Reino Unido por toda
década de 80. O falecimento do presidente da URSS, Leonid Brejnev, líder mais
longevo do período da guerra fria (1964-1982) foi o primeiro dos sinais do
enfraquecimento do regime comunista, que viria a desmoronar sete anos depois.
O embrionário rock nacional dava as caras, com o surgimento de
bandas que iriam explodir dali a pouco tempo, mas quem estava no auge do
sucesso era o grupo Blitz, com seu hit ‘Você não soube me amar’. Elis Regina
nos deixava, aos 36 anos, por causa de uma overdose de cocaína.
Durante essa Copa, tive minha primeira experiência com a morte,
com o falecimento de um tio avô, bastante próximo ao meu pai. Foi no dia do jogo
contra a Escócia. Com idade suficiente para compreender o mundo ao redor, as
memórias já se parecem mais com filmes cortados do que com fotos empoeiradas,
de 4 anos antes. A vida estava só começando e ainda assistiria a duas
eliminações de Copas antes de ver o primeiro título…
Fonte/Fotos: o post Minhas Copas: 1982 apareceu primeiro em Blog do Victor
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